Por Luís Coelho São vários os textos deste Lugar ao Sul dedicados ao principal motor da economia regional: o Turismo. Retomo hoje o tema, trazendo à colação a possibilidade de se criar uma taxa turística para o Algarve. O assunto é, seguramente, polémico. De facto, são muitos os que rejeitam liminarmente tal ideia com o argumento de que a mesma mata a “galinha dos ovos de ouro”. Por outro lado, haverá outros que, tal como eu, vêm nesta medida um importante veículo para democratizar os benefícios de um sector de actividade que, reconhecidamente, acarreta fortes externalidades negativas à região (vejam, por exemplo, o texto sobre a realidade do mercado imobiliário no distrito de Faro publicado recentemente no Jornal Barlavento: http://barlavento.pt/economia/faro-em-ultimo-lugar-no-ranking-de-facilidade-em-comprar-casa).
Antes de apresentar a minha proposta para a taxa turística Algarvia, gostaria de sumariar algumas ideias que me parecem relevantes sobre o caso de Lisboa pois este corporiza o exemplo mais conhecido da aplicação de algo similar no nosso País. Como muitos saberão, a taxa municipal turística da capital começou a ser aplicada no dia 1 de Janeiro de 2016, traduzindo-se na cobrança de um euro por noite por cada hóspede até um máximo de sete euros por dormida. Esta taxa é paga por quem pernoita em empreendimentos turísticos “tradicionais” (e.g., hotéis) e no alojamento local. O valor é cobrado aos hóspedes, sendo o pecúlio posteriormente entregue à câmara de Lisboa (CM Lisboa). Cabe ao Fundo de Desenvolvimento Turístico de Lisboa gerir as verbas arrecadadas. Em regra, estas são utilizadas para co-financiar projectos com interesse para a comunidade, tais como a requalificação do Palácio Nacional da Ajuda, a construção do terminal de actividade marítimo-turística ou programa de higiene urbana nas freguesias mais afectadas pelo turismo. O valor já obtido pela CM Lisboa com esta taxa é muito significativo: 13,5 milhões de euros em 2016, podendo chegar aos 15 milhões em 2017 (mais detalhes aqui: https://www.dn.pt/portugal/interior/medina-admite-subir-taxa-turistica-em-lisboa-8896330.html). Como economista fico preocupado sempre que o Estado pretende intervir na economia, nomeadamente através da criação de impostos ou taxas. No entanto, no caso em apreço, não só considero que a criação de uma taxa turística no Algarve é uma boa medida como sou inclusivamente da opinião que a mesma é de elementar justiça. O racional económico prende-se com a assimetria que o fenómeno turístico gera sobre quem reside na área geográfica onde as actividades turísticas se desenvolvem. Em particular, numa região como o Algarve, há um conjunto (importante) de agentes económicos que beneficiam directa e indirectamente do facto de muitos visitantes rumarem a sul para usufruir de actividades de lazer. Sendo claro: o turismo gera muito negócio a sul, de onde resultam empregos, lucros e impostos. Infelizmente, todos os que habitam na região acabam por sofrer um impacto negativo como resultado dessas mesmas actividades turísticas. A expressão máxima dessa realidade cristaliza-se no brutal impacto ambiental que o turismo tem no Algarve. Isto para já não falar do aumento do preço dos bens e serviços (imobiliário à cabeça), o efeito eucalipto do turismo ou a criação de um mercado de trabalho relativamente peculiar por comparação com o resto do País. A taxa turística aparece assim como um instrumento de redistribuição dos benefícios económicos do turismo. Mais: bem utilizada, pode ser um importante instrumento de política económica regional. Estou pois em condições de apresentar as suas linhas mestras. A primeira é a de que a taxa tem de ser praticada em todos os concelhos do Algarve depois de consideradas as suas especificidades. De facto, destinos consolidados como Portimão ou Albufeira deverão ter valores para a taxa mais elevados do que concelhos como Alcoutim ou Vila do Bispo. Tal diferenciação permite que a taxa ajude a democratizar o destino Algarve, dando sinais à procura sobre onde queremos mais (e menos) turismo. A segunda premissa prende-se com o reconhecimento da necessidade da taxa ter uma componente sazonal importante. Em particular, na chamada época baixa, a taxa deverá ser tendencialmente zero em todos os concelhos. Já nos meses de Julho e Agosto os valores para a mesma deverão ser consideráveis (talvez algo como dois euros por noite/hóspede) em áreas onde a procura turística é, quiçá, demasiado elevada. O terceiro pilar da minha proposta prende-se com a universalidade da aplicação da taxa turística no que toca à tipologia de alojamento. Dito de outra forma, esta seria pagável nos estabelecimentos ditos “tradicionais” e nos alojamentos locais. Tal filosofia é relevante para evitar distorções no mercado em face das marcadas diferenças que existem na tipologia de alojamento que está disponível no Algarve. As duas últimas premissas prendem-se com a gestão e a utilização da receita cobrada. No que toca ao primeiro aspecto, preconizo a criação de um fundo cujos accionistas teriam de ser entidades públicas (e.g. Região de Turismo do Algarve, Comissão de Coordenação e Desenvolvimento do Algarve) e privadas. De facto, na minha opinião, só a junção de público e privado poderá ajudar a concretizar o verdadeiro interesse da criação da taxa turística: a sua aplicação. Neste contexto, a minha ênfase é tripartida. Por um lado, admito que cerca de um quinto do valor da receita deveria de ser utilizada para promover o turismo de qualidade na região. Desta forma, a taxa turística serviria para melhorar o produto turístico que já oferecemos, algo que é seguramente benéfico para os diferentes agentes que operam neste sector. Por outro lado, dois quintos da receita deveriam ser aplicados na minimização das externalidades negativas provocadas pelo turismo. Cabem aqui projectos de conservação/recuperação da natureza, melhoria das infraestruturas do Algarve, limpeza urbana e outros de natureza similar. Finalmente, a receita sobrante teria de ser aplicada na criação de um fundo de capital de risco destinado a apoiar projectos empresariais de elevado valor acrescentado sempre e quando os mesmos não estivessem correlacionados com o sector turístico. Esta é provavelmente a ideia mais polémica de todas (sim, o turismo estaria a alimentar outros sectores de actividade que em nada o beneficiam) mas a mais interessante e relevante no longo-prazo. De facto, a sua materialização dotaria o Algarve de um mecanismo de captação de boas ideias as quais, de outra maneira, dificilmente rumarão ao sul do País (e da Europa). Nesse sentido, seria possível desenhar uma estratégia de longo-prazo que permitisse substituir com tranquilidade o nosso modelo económico regional actual (onde há economia a menos e turismo a mais) por um outro onde o turismo continuará a ter o seu papel mas agora bem acompanhado por outros sectores de actividade que, provavelmente, melhor servem o interesse da generalidade dos que por cá vivem e daqueles que cá se querem instalar.
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