Por Bruno Inácio Leituras a Sul (I): “Algarve Mediterrânico” Não só, mas mais desde que a dieta mediterrânica foi classificada como Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO que é recorrente se falar no espaço público sobre a dita cuja. Muitos falam mas pouco sabem certamente do que falam. Eu, desconhecedor, me confesso. Certo é que esta new wave gastronómica trouxe pratos made in “dieta mediterrânica gourmet” e não mais parou. Das sardinhas selecionadas mergulhadas numa fusão avermelhada e apimentada com cebola reservada até ao mimo de alfarroba com uma redução de chocolate negro e um cremoso de citrinos… são infindáveis as longas e muitas vezes incompreensíveis designações que se dá a coisas tão simples como sardinhas em tomate e torta de alfarroba. Não é uma critica. Entendo o porque e sou frequentador desses gastropub´s Algarvios, muitos deles resultantes do espirito empreendedor e aventureiro de gente jovem que quer fazer bem. E faz. Os “Time out” desta vida vieram para ficar e antes isso que o fish and chips, os baked beans e os Kebab´s. Agora que eu, rapaz nascido em Querença, coração do Barrocal Algarvio, que gosta de papas de milho com raspas no fundo do tacho, de feijão com couve e de jantar de grão, já mandei uns bitaites sobre matéria que não domino, permitam-me que vá ao que aqui me traz. O livro “Algarve Mediterrânico” (2015, Tinta da China), premiado internacionalmente por diversas vezes, da autoria da investigadora Maria Manuel Valagão, do fotógrafo Vasco Célio e do Chef Bertílio Gomes é uma obra de excelência que mete dentro de um prato tudo aquilo que somos, de onde viemos e porque comemos assim. Muito bem organizado, esta publicação é daquelas coisas que se lê bem. Sim, isso mesmo, lê-se bem. Bem sei que é um livro sobre gastronomia e contém receitas, mas é muito mais do que isso. É um livro que nos fala sobre as paisagens do Algarve, o seu património imaterial e um conjunto de factores que em conjunto fazem de nós Algarvios. É por isso que o considero um dos melhores livros sobre o Sul, um verdadeiro mapa para a Algarviedade.
Depois porque o livro apresenta um conjunto de receitas de cozinha contemporânea que elevam os produtos da terra e do mar a actores principais sem que dali advenha qualquer presunção saloia. É identidade Algarvia em estado puro, e isso é muito difícil de conseguir. Finalmente e não menos importante a celebração da máxima “os olhos também comem”. Neste livro é possível sentir o sabor e o cheiro da hortelã acabada de cair num prato de jantar de grão, simplesmente (e complicadamente) porque o Vasco Célio conseguiu captar todos esses sentidos com a objectiva da sua máquina fotográfica. Mas porque o ritual do petisco é mais, muito mais, do que o petisco em si, também ali cabem as paisagens, as artes e os ofícios registados subliminarmente. As coisas não precisam ser complexas para serem boas. O bom gosto é muitas vezes simples. O bom gosto é descomplexado e fala a nossa língua. E esta publicação guarda em si todas essas qualidades.
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