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Ressequidos que nem passas do Algarve

3/11/2017

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Por Gonçalo Duarte Gomes

Portugal atravessa uma seca extrema, que não será lavada com as chuvas que felizmente acabam de chegar.

No Algarve em particular, escassez de água não é defeito, é feitio.


No entanto, há na região um qualquer distúrbio de personalidade que a leva a comportar-se como se fosse bafejada pelas monções... 
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Em Janeiro de 2007, o núcleo regional do Algarve da Liga para a Protecção da Natureza, promoveu na Universidade do Algarve umas jornadas de trabalho em torno de um documento que então estava em elaboração, e que prometia ser a ferramenta decisiva para a resolução do drama nacional que era, já na altura, a má gestão da água: o Plano Nacional para o Uso Eficiente da Água (PNUEA).

Dessas jornadas (das quais este vosso escriba foi relator) resultou o documento abaixo, que convido a ler, onde é sintetizado o decurso dos trabalhos e compiladas as conclusões alcançadas sob forma de propostas de medidas (muitas permanecendo tristemente actuais, com os seus quase 11 anos), como contributo para o processo do PNUEA que, recordo, em Janeiro de 2007, estava para breve.
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Conclusões Jornada PNUEA 2007
File Size: 1266 kb
File Type: pdf
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De resto, era de brevidade que se falava já quando, em Junho de 2005, através da Resolução do Conselho de Ministros nº 113/2005, haviam sido aprovadas as bases e linhas orientadoras para esse Plano. Não obstante tanta celeridade, este processo foi correndo, mais ou menos com a mesma eficiência do tema que pretendia abordar. É por isso que, desde então até hoje continua a ser mais ficção do que realidade, apesar de “recentemente” (2012) ter levado um toque de desfibrilador.

Águas praticamente estagnadas, portanto.

E esse é o nosso flagelo. Não a pouca ou muita água de que dispomos, mas a utilização desleixada e displicente de toda ela, desprezando qualquer atitude preventiva ou de protecção de um recurso absolutamente vital.

À cabeça das causas, o desperdício, que, incluindo perdas no sistema de armazenamento, transporte e distribuição e uso ineficiente, se estima nuns alegres 30 a 40% (de acordo com dados de 2002, ainda utilizados como referência oficial, e cuja falta de actualização reflecte bem a descontracção portuguesa neste tema). É como beber um copo de água e cuspir fora metade.

Seguidamente, a própria natureza dos usos.

Basta percorrer os espaços públicos da região e ver a quantidade de relvados existente, os elementos de água que todo o canteiro deve ter, os elencos vegetais dominados por vegetação alóctone sedenta de rega intensa, a rega em horários desadequados e através de técnicas pouco eficientes ou a falta de manutenção desses sistemas de rega – garantindo ao menos que o nosso asfalto e os nossos passeios não morrem de sede!

E isto apenas no meio urbano.

Também a constelação de piscinas que cintila na paisagem ou a falta de fiscalização de captações subterrâneas são ónus hídricos permitidos pelo laxismo e/ou nacional-porreirismo da decisão política no processo de ordenamento e gestão territorial.

Passamos para a agricultura, e para além de muitas más práticas toleradas na gestão da água, vemos o sequeiro, ancestralmente adaptado às condições edafo-climáticas da região, a ser arrancado pela raiz para dar lugar a outras culturas, baseadas em regadio intensivo e extensivo.

No turismo, a pressão do boom populacional estival sobre os recursos hídricos da região é outro sumidouro, somada à reprodução ampliada dos erros de casting no desenho dos espaços exteriores, bem como às tipologias adoptadas, promotoras de consumos intensivos de água – mas que continuam a preencher os sonhos, ironicamente molhados, dos decisores.

E temos depois também os consumidores particulares, entre os quais há muito boa gente que, mesmo sob a ameaça de racionamento de água, acha que é mais importante banhos de imersão, lavagens de varandas e pavimentos à mangueirada ou andar com o bólide a brilhar  do que essas minudências de secas.

Ou seja, há toda uma cultura transversal de incúria na gestão da água.

Face às suas características, seria mesmo interessante um estudo da capacidade de carga do Algarve, em termos de recursos hídricos, ou pelo menos da viabilidade da actual carga. As opções com que seremos confrontados num futuro próximo, recomendam que nos dotemos desse conhecimento.

Porque, indiferente às nossas opiniões ou caprichos, a realidade vai-se impondo.

O passado mês de Outubro foi, de acordo com dados do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), o mais quente dos últimos 87 anos.

O Palmer Drought Severity Index (PDSI) é um índice utilizado para monitorizar o estado de seca no território nacional, combinando os efeitos de temperatura, precipitação e capacidade de água disponível no solo. Actualmente, e de acordo com esse índice, o Algarve encontra-se em seca severa, o segundo estado mais grave.

​Estas ocorrências, mais do que episódios fortuitos – ou falta de amizade divina, segundo o evangelho de Calvão da Silva – inserem-se numa tendência de evidente agravamento do clima, se analisarmos a evolução do PDSI para a série climática 1931-2000. 
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Evolução do PDSI em Portugal Continental. Médias para as décadas de 1961-70, 1971-80, 1981-90 e 1991-2000 (esquerda para a direita), para Fevereiro, Março e Abril (cima para baixo). Fonte: Santos, F. e Miranda, P., Alterações Climáticas em Portugal. Cenários, Impactos e Medidas de Adaptação – Projecto SIAM II, Gradiva, 2006: pp. 51–60
Para lá disto, também 7 dos 10 Verões mais quentes desde os anos 30 foram registados depois da viragem do século.

Além da questão das disponibilidades para consumo, um aspecto tão ou mais importante é a disponibilidade hídrica no solo, responsável pela manutenção da capacidade de suporte de vida, que assegura a função vital da água na paisagem.
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Sem surpresas, e novamente com base em dados do IPMA, também esse indicador está mirrado neste momento.
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Se a água que metemos na gestão dos recursos hídricos abastecesse reservas, podíamos chamar o Noé, tal não seria a dimensão do dilúvio.

Só que não.

Assim, mais até do que água, falta-nos mesmo é o mais elementar bom-senso.

Enquanto esta cultura não mudar, bem como os comportamentos que a traduzem, podemos teorizar, construir mais barragens (obrar oblige!), chorar e até orar à vontade, que a inexorável caminhada no sentido de ficarmos ressequidos como as proverbiais passinhas do Algarve não se deterá.

Pior, ficaremos ressequidos e mal-agradecidos…
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