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Os ingleses no Algarve do século XVIII não iam à praia: comercializavam figos e amêndoas

29/7/2020

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Por Andreia Fidalgo

Na passada sexta-feira, o Algarve voltou a receber notícias desanimadoras: o Reino Unido decidiu manter Portugal fora da lista dos corredores aéreos, tornando ainda mais negras as já magras potencialidades de recuperação do sector turístico regional.

Neste cenário não há grande margem para dúvidas no que respeita aos impactos negativos para a região. Tal como foi evidenciado pelo presidente da Região de Turismo do Algarve, João Fernandes, o mercado britânico representa, a nível do mercado externo, um terço das dormidas da região (33%) e quase metade dos passageiros que desembarcam no Aeroporto de Faro (49%).

Como recuperar deste golpe? Já várias estratégias têm sido apontadas – inclusivamente aqui, no Lugar ao Sul – a curto e a longo prazo. A curto prazo, passam evidentemente pela promoção do Algarve no mercado interno, com a captação de turistas nacionais, mas também no mercado externo, junto de outros países europeus em que as restrições de circulação não se imponham. A mais longo prazo, a estratégia terá de passar sempre pela diversificação da economia regional, o que permitirá reduzir a excessiva dependência do sector turístico.

A dependência do turismo é, obviamente, um reflexo da contemporaneidade, mas a dependência económica relativamente aos ingleses tem raízes históricas bem mais antigas. A propósito das restrições agora impostas pelo Reino Unido, tem sido por diversas vezes relembrado o Tratado de Windsor, assinado em Maio de 1386 entre Portugal e Inglaterra, e que é considerado a mais antiga aliança diplomática do mundo ainda em vigor.

Porém, no que diz respeito à problemática económica, é verdadeiramente significativo invocar os acordos e tratados assinados entre Portugal e a Inglaterra após a Restauração da Independência, em 1640: por acordo de 1642 e, sobretudo, após o tratado de 1654, aos comerciantes britânicos garantiu-se a liberdade de comércio e a liberdade religiosa, abriram-se os portos portugueses na Europa, mas também na Ásia e na África e facilitou-se o comércio colonial. Caso paradigmático é o da exportação do vinho do Douro, negócio que os britânicos dominariam a partir da segunda metade do século XVII, domínio este que não se limitava apenas ao trato comercial, mas que também envolvia todo o processo produtivo. Com o Tratado de Methuen, em 1703 – que, muito breve nas suas cláusulas, determinava que os portugueses retirariam as restrições à importação dos têxteis ingleses e, em troca, os britânicos reduziriam os direitos de importação do vinho português – assegurou-se a continuidade e hegemonia inglesa no lucrativo negócio do vinho, a que se associavam outros mais géneros.

Estes acordos, particularmente o Tratado de Methuen, transmutaram-se numa presença significativa de homens de negócios britânicos no território português, e acentuaram a dependência económica de Portugal face a Inglaterra.

Neste contexto, o Reino do Algarve não foi excepção. Na realidade, um dos problemas invocados para a ruína económica da região, na década de 70 do século XVIII, era precisamente a forte presença de algumas casas comerciais inglesas, que monopolizavam o comércio dos principais frutos regionais. A principal casa comercial, à época, era a do inglês João Lampriere, que sediara o seu negócio em Faro, apoiado numa rede de comissários distribuídos por todo o Algarve, e exportava os frutos regionais por comissão, sem que qualquer comerciante regional lhe pudesse fazer concorrência. A este somava-se o inglês, João Crispim de nome aportuguesado, que estabelecera uma outra casa comercial em moldes semelhantes à de Lampriere, ou ainda, a título individual, os ingleses João Keating e Parcar Pitts. Alguns destes homens eram oriundos de famílias inglesas que se haviam estabelecido no território algarvio a partir de meados do século XVII: parece ser este o caso, por exemplo, de Parcar Pitts, muito provavelmente descendente de Jan Parcher (Parker), mercador estabelecido em Tavira em 1651.
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Estes comerciantes ingleses alimentavam as rotas comerciais do Algarve com o Mediterrâneo e, sobretudo, com o Atlântico Norte, através da exportação dos frutos e géneros regionais de maior valor. Assim, para Gibraltar, Inglaterra, Irlanda, França, Países Baixos, Alemanha, Dinamarca, e até para a América do Norte, saíam do Algarve, pela mão dos ingleses, o figo, a amêndoa, a alfarroba, a laranja, o limão, o vinho, a cortiça e a cana. Essas mesmas rotas comerciais faziam chegar ao Algarve ferro, aço, madeira, alcatrão, tecidos variados, queijo, manteiga, arroz, entre outros géneros.

Podemos, em suma, dizer que o comércio regional estava dependente dos ingleses… Na mesma medida em que hoje podemos dizer que o turismo está, numa parte bastante substancial, dependente dos ingleses. E, tal como hoje se procuram estratégias para minimizar os efeitos económicos desta dependência em tempos de Covid, também naquela época se procurou diminuir a excessiva dependência que tinha o comércio regional dos homens de negócios ingleses.

Diminuir a dependência económica de Portugal face a Inglaterra foi uma estratégia claramente assumida pelo Marquês de Pombal através das suas políticas económicas e, inclusivamente, com a criação das companhias monopolistas pombalinas, mormente com a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. No que ao Algarve diz respeito, a estratégia adoptada passou por uma integração económica do Reino do Algarve no restante Reino de Portugal: aboliram-se os direitos duplicados que pagavam os frutos e géneros algarvios quando transacionados –  que até então eram tratados como se fossem oriundos de um reino estrangeiro –, e procurou-se que algumas das matérias-primas e produtos alimentares de que a região necessitava fossem fornecidos pelo Reino de Portugal, ao invés de serem importados do Atlântico Norte. Procurava-se, dessa forma, que a abolição de direitos pudesse resultar numa maior iniciativa e capacidade competitiva por parte dos comerciantes algarvios, e reduzir o monopólio dos ingleses na saída e entrada de produtos na região.

A estratégia pombalina acabou por resultar na região, dando origem, nas décadas seguintes, à emergência de comerciantes de origem portuguesa, que substituíram os ingleses no seu primado.
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Será caso para indagar se hoje, perante a situação actual, não nos faltará uma visão estratégica que produza efeitos mais duradouros. Procurar remediar a crise do turismo com o mercado interno, ou apelar a mercados externos alternativos ao inglês podem ser soluções a curto prazo – insuficientes, é certo! – mas o verdadeiro problema estrutural da região, ou seja, a excessiva dependência económica do sector turístico, mantém-se inalterado. A solução é a que tem vindo a ser já por diversas vezes notada, isto é, é fundamental diversificar a base económica da região. No entanto, esta solução requer uma visão estratégica ponderada e com efeitos a mais longo prazo - será que a saberemos, realmente, desenvolver?
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João
29/7/2020 12:18:09

Vivemos tempos mais complexos que os do Marquês de Pombal. Mas a ideia terá de ser a mesma, criar condições para que as empresas que operam em solo algarvio distribuam na região parte dos benefícios. O ideal seria que fosse portuguesas mas os grandes grupos hoteleiros são a regra e esses pouco deixam no Algarve que salários mínimos.

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