Por João Fernandes
É hoje cada vez mais comum ouvirmos dizer que o sentido da palavra democracia ("governo do povo") tem sido esvaziado ao longo dos tempos. Que este regime político, eleito pelos povos de todos os países mais desenvolvidos, foi reduzido à mera escolha de representantes. Que não existe uma participação ativa e efetiva da sociedade civil na administração dos seus interesses. Mas será que nós, os cidadãos, estamos genuinamente disponíveis para participar? O que fizemos quando a oportunidade/dever nos bateu à porta? Em Portugal, realizaram-se até hoje três referendos nacionais, dois sobre Interrupção Voluntária da Gravidez (1998 e 2007), e um sobre a Regionalização (1998), mas nenhum deles contou com mais de 50% dos eleitores… A taxa de abstenção nas eleições para a Assembleia da República passou de 8,5%, em 1975, para 44,1%, em 2015! Nas últimas eleições autárquicas (2013) a abstenção chegou mesmo a 47,4% e na eleição do atual Presidente da República 51,3% dos eleitores “optaram” por não votar (dados PRODATA). Como podemos retratar a nossa participação? A democracia também é o que dela fazemos! Bem, mas será que estamos todos amorfos ao que se passa à nossa volta? Não é bem assim, um exemplo em voga de democracia participativa são os orçamentos participativos, que tem o propósito de submeter o aplicação de parte dos recursos públicos à consulta pública. Em Portugal, os Orçamentos Participativos estão cada vez mais consistentes e enraizados na cultura democrática local. Temos assistido a um crescimento exponencial do recurso a estes mecanismos, com particular expressão nas autarquias (camaras municipais e juntas de freguesia) e em iniciativas direcionadas para a juventude. Ao nível nacional, concretizou-se pela primeira vez este ano o Orçamento Participativo Portugal, que, de acordo com o Primeiro-ministro António Costa, “será para repetir em 2018 e com mais dinheiro.” Segundo a entidade responsável pelo Observatório Nacional dos Processos de Democracia Participativa em Portugal, a Associação In Loco (com sede no Algarve), “Portugal é o único país com um Orçamento Participativo (OP) a nível nacional e um dos países com maior número de OP, considerando que não existe enquadramento legal que torne obrigatória a realização dos mesmos por parte dos municípios, uma vez que resultam da vontade política em envolver os cidadãos nas decisões de investimento sobre os seus territórios.” O primeiro orçamento participativo desenvolvido em Portugal teve lugar em Palmela e São Brás de Alportel foi o município algarvio pioneiro no desenvolvimento desta abordagem. São Brás de Alportel detém aliás o OP com mais continuidade. Desde 2006, 12 municípios desenvolveram OP no Algarve, sendo que São Brás de Alportel e Tavira criaram ainda OP dedicados especificamente à juventude. É certo que os OP não apresentam todos a mesma ambição, temos casos em que o processo é apenas consultivo e outros em que a população pode propor e votar projetos. E será que para 2018 esta onda vai crescer? Realizar um OP depende sempre da decisão dos executivos municipais e não é possível fazer esta previsão. Sabe-se, contudo, que este será um ano atípico em termos de continuidade dos OP, devido às eleições autárquicas. Ao longo do ciclo dos OP em Portugal, os anos de eleições têm representado quebras na continuidade de alguns processos, devido às mudanças de executivo, e prevê-se que este período não seja diferente. Fica aqui o repto para que haja vontade política de envolver os cidadãos nas decisões que lhes dizem respeito e que a adesão dos cidadãos a estas boas práticas transmita também o devido reforço a quem as executa!
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