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Bem-vindo

O plano para salvar o resto das nossas vidas

7/6/2019

4 Comments

 
Por Gonçalo Duarte Gomes

Moisés voltou a descer do monte!

Mas, em vez do Monte Sinai, foi do Cerro de S. Miguel. E, em vez do Decálogo, trouxe uma pendrive.

E nessa pen… vinha o Plano!

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Foi apresentado o Plano Intermunicipal de Adaptação às Alterações Climáticas do Algarve, que servirá de guião ao rumo que a região vai seguir para encaixar os efeitos do ciclo de alterações climáticas que atravessamos.

​Em claro prejuízo do efeito dramático, não por Moisés, mas por técnicos responsáveis pela elaboração do documento.

Mas técnicos e plano são, efectivamente, equiparáveis ao profeta e às Tábuas dos Mandamentos.

Porque são encarados mais ou menos da mesma forma por aqueles que supostamente à sua luz regem a sua vida: sabemos que estão lá, até concordamos genericamente com a orientação da coisa, mas interpretamos numa adaptação muito livre, e sempre para nossa melhor conveniência.

Ou seja, a importância que lhes damos no nosso quotidiano é relativa.

Não que plano algum tenha alguma vez mudado o que quer que fosse. São as decisões que se tomam aquilo que realmente cria – ou não – mudança. Decisões pessoais, decisões colectivas... decisões políticas, baseadas (ou não) nos planos.

E aí, apesar do ambiente estar na ordem politicamente correcta do dia, tarda em entrar em pleno na ordem executiva. Por isso, muito se fala de alterações climáticas, emergência climática, mudança de paradigma, etc., mas sem grande consequência.

E não, não falo do Parlamento a declarar a “emergência climática”. Da Assembleia da República já saem embustes que cheguem, não é preciso mais um...

Porque a emergência não é climática. É humana. O clima sobreviver-nos-á por muito tempo. O planeta também. A questão coloca-se apenas se tal acontece em condições que permitam a continuidade da nossa espécie, e se tal ocorre em condições enquadráveis em parâmetros de qualidade e dignidade, ou se mergulhamos nos piores cenários apocalípticos, amplamente explorados pela ficção científica.

O nosso pecado original está no modelo de organização social e económica. Por exemplo, de pouco nos adiantará erradicar os plásticos ou alterar hábitos alimentares se não derrubarmos o primado da voracidade e do desperdício, sobre o qual assentamos neste momento, e que origina tudo o resto.  No fundo, de pouco adianta decoração, por muito bonita que seja, num edifício que está a colapsar...

Um dos “restos” a que me refiro é o efeito amplificador de fenómenos extremos associado às alterações climáticas. Neste capítulo, sendo certo que nem todos acreditam na excepcionalidade do actual ciclo de alterações climáticas (a mudança é a única constante ao longo da história do planeta), e que a margem de incerteza em qualquer sentido é grande, mesmo quanto ao desconhecimento do quanto desconhecemos, penso que ninguém discordará da necessidade de alterar certos hábitos civilizacionais claramente insustentáveis, agora que dessa circunstância temos consciência.

Mas isso implica que enfrentemos um desafio no espaço e no tempo. No espaço porque os mais vulneráveis e mais expostos aos efeitos nocivos (regra geral, camadas economicamente mais desfavorecidas, seja em países eles próprios “pobres” ou em países “ricos”) são aqueles a quem menores responsabilidades podem ser imputadas, e no tempo pois estamos perante um teste de solidariedade inter-geracional, já que alterar o paradigma implica abdicarmos hoje de boa parte daquilo que qualificamos como qualidade e hábitos de vida, em favor da qualidade e hábitos de vida dos vindouros.

Cometamos portanto, de forma deliberada, o hiperbólico erro de achar que é o nosso o tempo de todas as mudanças, pois é-o de facto, já que é nele que vivemos e que viverão aqueles de quem gostamos. Sem catastrofismos (excepto talvez os emancipatórios, como descritos por Ulrich Beck), e com pragmatismo.

Ora é precisamente para enfrentar essas mudanças que o presente plano surge.

É cedo para falar desse documento propriamente dito, pois ainda não está disponível para leitura. Mas já temos reacções à sua apresentação, realizada no passado dia 4.

Destaco a muito positiva declaração de Jorge Botelho, presidente da AMAL – Comunidade Intermunicipal do Algarve e presidente da Câmara Municipal de Tavira, que revelou a vontade dos autarcas da região, no sentido de “começar já a fazer coisas”.

As fotografias do evento comprovam a presença de muitos autarcas, de facto. Mas resta saber se a sua presença foi de circunstância ou se escutaram efectivamente o que lhes foi dito.

E prová-lo será facílimo. Principalmente porque parte das “coisas” que podem começar já a fazer é… deixar de fazer.

Um caso paradigmático é o da praia fluvial serrana sonhada para São Brás de Alportel, com abertura de novas captações nos aquíferos subterrâneos, para manter em permanência um plano de água que não existe. Curiosamente, ou inexplicavelmente, com recurso a financiamento por parte do mesmo quadro comunitário que financia este plano e que identifica as disponibilidades hídricas como um dos principais desafios a enfrentar no Algarve.

Outro é o autêntico boicote que foi movido às intervenções de renaturalização das ocupações ilegais das ilhas barreira da Ria Formosa, que se integram em zonas de máxima exposição à subida do nível médio do mar e a fenómenos climáticos extremos.

Juntemos a crescente implementação de culturas de regadio, seja no contexto do urbanismo, da agricultura ou do turismo, em detrimento de sistemas de predomínio do sequeiro.

O leque de contra-sensos no Algarve, face ao seu enquadramento biofísico, é vasto.

Ao que parece, todos eles invisíveis e indecifráveis, sem um plano. Um plano para fazer prevalecer o que, aparentemente, se resolvia com sensibilidade, bom senso e proporcionalidade.

Pois bem, ei-lo.

​E com ele, o fim das desculpas.
4 Comments
Miguel
7/6/2019 13:50:14

Gostei da comparação biblica Gonçalo, "habemus Planum" no pdf disponibilizado pelo jornal "Barlavento" vi coisas adequadas e que se postas em pratica certamente teriam efeitos positivos, mas vi também uma fixação quase total na necessidade de garantir viabilidade económica da região sobretudo assente no modelo Turismo.
No departamento florestal vi falar-se (e bem) da alfarrobeira como espécie com potencial e do inevitável declínio do sobreiro, mas não vi uma única linha sobre restantes espécies (autóctones ou de regiões mediterrâneas) que podendo não ter impacto económico imediato, fornecem serviços avaliados em muitos milhares e milhões de euros, e volto a frisar a pertinência do livro" Portugal em Chamas" onde ideias e planos sólidos sobre salvaguarda florestal são expostos.
"e pouco nos adiantará erradicar os plásticos ou alterar hábitos alimentares se não derrubarmos o primado da voracidade e do desperdício, sobre o qual assentamos neste momento, e que origina tudo o resto." - Esta sua frase resume perfeitamente o ponto central do insustentabilidade vigente, é que por muito salutares que sejam as medidas individuais de recolha de lixo, reciclagem etc, são apenas paliativos de uma grave doença.
Finalmente no que respeita a novos empreendimentos turísticos como seja a praia fluvial na fonte férrea (e uma unidade hoteleira em plena serra?) contradizem discursos, cimeiras, seminários e são intoleráveis tendo em conta a informação e alternativas em cima da mesa e as consequências que criarão a troco de uns trabalhos mal pagos e sazonais (business as usual), que melhor exemplo que o da Quinta da Ombria?

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Gonçalo Duarte Gomes
9/6/2019 10:34:20

Miguel, é precisamente no confronto entre as palavras de circunstância dos autarcas/responsáveis regionais e as suas efectivas tomadas de decisão que reside o ponto crítico neste processo.
Enquanto o discurso for vazio face à acção, podemos redigir os planos que bem entendermos, que nenhuma mudança surgirá, excepto aquela causada pela inevitável imposição da realidade...

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Ricardo
26/6/2019 08:14:30

Caro Gonçalo,
Obrigado por esta peça e por ousar (e apelar para) de algum bom-senso num tema alegadamente tão 'quente'.
Obrigado por evidenciar as contradições que denunciam 'as palavras de circunstância' e nos fazem intuir a escala da fraude que é governar portugal (não será o pior país do mundo)
Sou amplamento ignorante acerca do Plano Intermunicipal etc, e acerca do calendario e tecnicalidades das sucessivas medidas.
Um ponto a que fui sensível foi a expressão 'o primado da voracidade e do desperdício' enquanto motor do pecaminoso 'modelo de organização social e económica'. Parece por o ónus na 'sociedade'. Em todos nós. Não somos historicamente vorazes e despesistas. E a concordar que seja um fenomeno recente, também não vejo voracidade e desperdicio em mim ou em que me rodeia. Nao vejo desespero de comprar e consumir. Vejo outrossim desespero de vender. E em resumo, enquanto for permitido que os vendedores enfiem a sua mercadoria pela garganta dos nossos filhos abaixo, seja pelo telemovel, pela televisao ou pela internet, nada mudará. Mas as empresas têm que sobreviver, não é? Experiemente-se, por hipótese, acabar com a publicidade, e imagine 'o quê' e 'quanto' é que 'as pessoas' querem. E enquanto a publicidade ocupar todo o nosso espectro sensorial não nos resta `largura de banda` para perceber nada e denunciar o que quer que seja. A ideia é para-socialista, mas vem-se-me tornando uma auto-evidencia. Nascemos e somos atirados aos cães. Não há música ou discurso que não diga que 'precisamos ser salvos'. Divago.

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Gonçalo Duarte Gomes
29/6/2019 12:24:44

Ricardo, muito obrigado pela reflexão (e não divagação).
Os nossos desafios climáticos (e não só) globais contemporâneos encerram um paradoxo de difícil gestão: o que fazemos individualmente é estatística e materialmente irrelevante, mas tudo o que fazemos enquanto indivíduos contribui para a composição do problema, quer falemos de consumo, de emissões de carbono, do que seja.
Daí que, mesmo que adoptando comportamentos individuais mitigadores de males maiores, não deixamos de ser responsáveis. Este é um dos raros casos em que a língua inglesa me parece ter melhores soluções para separar as águas: somos "accountable", mesmo não sendo "responsible", não tendo a certeza de estar a ser claro o suficiente.
Mas a tónica principal gostaria de a deixar na visão urgente mas não cataclísmica, principalmente porque quando falamos de clima e ambiente, somos parte e não todo. Essa perspectiva, mais humilde e consciente da nossa fragilidade, pode facilitar a mobilização para a necessária acção.

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