Em alguns casos, o lugar do património pode situar-se próximo do lugar da desesperança, apesar de este ser o ano europeu dedicado ao património cultural, sob o lema «Património: onde o passado encontra o futuro» (cf. http://anoeuropeu.patrimoniocultural.gov.pt/). Aí nos situa o último artigo de Aurélio Cabrita, no jornal Terra Ruiva a propósito do património monumental do concelho de Silves (https://bit.ly/2ByVfrd), e que um outro artigo de Paula Bravo também já deixara a nu. (https://bit.ly/2DH7LGu).
Junto-me às suas vozes. Mas, perante esta realidade, quero concentrar-me na ideia de que tudo é possibilidade e que dizê-lo é já forma nascente de esperança. No campo de futuros possíveis, a educação através do património (em sentido abrangente) terá um papel crucial, nomeadamente na identificação dos cidadãos com o seu espaço e com a memória colectiva. A história, a memória, os lugares estão carregados de sentidos, de conhecimento científico e cultural, que se manifesta de forma viva no património e que podemos explorar com recursos pedagógicos adequados, envolvendo a comunidade. Oferecer às crianças e aos jovens a possibilidade de aprender através da sua herança patrimonial, preservada nas aldeias, vilas ou cidades, é iniciá-los pelas «planícies e os vastos palácios da memória, onde estão tesouros de inumeráveis imagens veiculadas por toda a espécie de coisas que se sentiram» de que nos fala limpidamente Santo Agostinho. O processo de defesa do património comum pode nascer aí, nessa construção da memória individual e afectiva onde se guardam os nossos «tesouros» (Santo Agostinho, Confissões. Lisboa: INCM, 2004, p. 241). Não se protege o que não se conhece. É, por isso, imprescindível preservar e comunicar. Aprofundar o trabalho colaborativo entre os arquivos, os museus, as bibliotecas, os centros de documentação e as escolas e centros de formação de todos os níveis de ensino é um caminho profícuo, de que há exemplos felizes. Uma das possibilidades será a construção de projectos educativos e planos de actividades conjuntos que satisfaçam os objectivos e metas pedagógicas e que, ao mesmo tempo, enriqueçam o curriculum, permitindo aos alunos a compreensão e o acesso à herança patrimonial local: a primeira que têm o direito de conhecer e o dever de preservar. Poderemos assim educar um olhar capaz de procurar razões – anteriores e interiores –, na certeza de que a cor do tempo é uma só, a do coração; como, muito melhor do que nós, diz Pedro Tamen (in O Livro do Sapateiro): Há um rio e o outro lado do rio. Ao longe há um verde entrando pelos olhos que fecho e sem saber ao certo se o que entra é a cor de um certo tempo antigo ou o licor de um outro tempo novo. E verifico então de olhos molhados que não há que saber nem distinções na paisagem — que é uma só no largo coração.
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