Por André Botelheiro Quis o mês de dezembro lacrar o ano de 2018 com uma emotiva e justa homenagem a um dos maiores intérpretes deste lugar ao sul. Porém, não avisou, porque de nada serve avisar, para uma partida que é sempre prematura, sobretudo para quem ainda assim pensava, escrevia e dizia. O doutoramento Honoris Causa do Professor Joaquim Romero Magalhães, atribuído pela Universidade do Algarve, no passado dia 12.12.2018, foi o encore a uma vida plena, na academia, na política, na família, na amizade. No eloquente elogio que apadrinhou a distinção, proferido pela discípula ao seu mestre, colega e amigo, Maria Leonor Freire Costa, docente da Universidade de Lisboa, pugnou que: «a Joaquim Romero Magalhães, a região deve uma insubstituível história económica atenta». «Como mostrou nos milhares de páginas que sobre o tema escreveu, o Algarve revela-se efetivamente um espaço económico, separado do Alentejo e do resto do país por forças em parte ditadas pela geografia, sendo em 1700 mais rural que em 1500. Estão ainda por fazer monografias histórico-económicas semelhantes sobre outras regiões do país». Nesta derradeira cerimónia, Joaquim Romero Magalhães dedicou grande parte do seu discurso ao Algarve, a este lugar ao sul: «Sou algarvio por nascimento e por uma continuada vivência. Porém, nem regionalista, nem exclusivista. Tenho procurado instalar-me numa neutralidade que me permita ser justo e avaliar, com equilíbrio, aquilo com que me depreendo. Nem tudo no Algarve é bom, nem tudo aquilo que nos rodeia em Portugal deve ser desprezado». Este desprendimento, que só quem muito ama sabe e pode ter, nunca o deixou afastar-se da sua permanente inquietude pela busca incessante das melhores respostas às melhores perguntas: «Será o Algarve definível? Concentrado em meia dúzia de palavras, cristalizado nuns tantos conceitos e difundido em não menos preconceitos? A que metáforas há que recolher? O Algarve é uma história. Uma literatura. Uma paisagem. Uma tonalidade luminosa: é um viver e saber viver e é um conjunto daquilo que, afinal, nos rodeia e conforta. É tudo isso. O que se vê e o que não se vê. O que é material e o que paira acima dessa realidade. É um todo, não pode ser fragmentado. É algo que ainda hoje me desperta os sentidos». Para o sempre, ficamos com a lúcida e douta última lição do Professor Joaquim Romero Magalhães, na terra que escolheu como sua, e na universidade que ajudou a erguer. (Ver discurso a partir dos 37:20) Sobre Joaquim Romero Magalhães (1942 – 2018):
Nasceu em Loulé a 18 de abril de 1942. Fez a Escola Normal e o Liceu em Faro. Na cerimónia da sua jubilação, em 2012, referiu-se a esse seu percurso na cidade de Faro como tendo sido determinante na sua formação, designadamente pelo convívio que aí teve com as classes mais desfavorecidas da cidade. Licenciou-se em História na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, em 1967. Obteve o grau de Doutor, em 1984, na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e integrou o corpo docente dessa Faculdade. Foi nomeado em 1994 professor catedrático daquela Universidade. Durante o seu percurso de docente universitário foi professor convidado da École des Hautes Études en Sciences Sociales, de Paris (1989 e 1999), da Universidade de São Paulo (1991 e 1997) e da Yale University (2003). Coordenou o volume “Alvorecer da Modernidade”, vol. III da História de Portugal dirigida por José Mattoso (1993). Publicou recentemente “Vem aí a República! 1906-1910” (2009). Na Imprensa da Universidade está a reunir obra dispersa com o título genérico de Miunças, três volumes (2011-2012). Presidente do Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra (1963), Presidente da Associação Académica de Coimbra (1964); Deputado à Assembleia Constituinte da República Portuguesa (1975-1976); Secretário de Estado da Orientação Pedagógica dos governos presididos por Mário Soares (1976-1978); Presidente do Conselho Diretivo da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (1985-1989 e 1991-1993); Comissário-Geral da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses (1999-2002), e diretor da revista Oceanos (1999-2001). Membro da Comissão Consultiva das Comemorações do Centenário da República (2009-2011). Dirigia a revista “Anais do Município de Faro” A 18 de abril de 2012 jubilou-se, tendo proferido a “última lição” na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Joaquim Romero Magalhães colaborou com a Universidade do Algarve desde os seus primórdios, defendendo esta instituição num dos momentos mais difíceis da sua instalação. Nos Seminários organizados em 1982 e 1983, subordinados à temática “Portugal Mediterrâneo, o Algarve no contexto português” e destinados à melhor integração dos emigrantes portugueses em férias no Algarve, Joaquim Romero Magalhães foi uma das personalidades que proferiram lições no âmbito dos Programas dessas realizações. A sua colaboração estendeu-se posteriormente a algumas edições do Mestrado em “História do Algarve”, assegurando blocos temáticos da componente escolar desse grau. Participou em diversos júris de doutoramento que conduziram à qualificação do corpo docente da UAlg. Pode referir-se os casos do António Rosa Mendes ou do José Carlos Vilhena Mesquita, criando com o primeiro uma relação de enorme proximidade que foi bruscamente cortada com a morte deste professor da Universidade do Algarve. Na sessão de homenagem que a Universidade do Algarve dedicou a António Rosa Mendes, Joaquim Romero Magalhães foi um dos oradores. Promoveu, juntamente com Manuel Viegas Guerreiro, a publicação de duas descrições do Algarve do século XVI: Corografia do Reino do Algarve (1577), de Frei João de S. José, e História do Reino do Algarve (circa 1600), de Henrique Fernandes Sarrão. Dois textos fundamentais para compreender a história do Algarve. A sua bibliografia inclui inúmeros trabalhos sobre o Algarve Económico, centrando-se especificamente nos séculos XVI, XVII E XVIII. Faleceu em casa, na cidade de Coimbra, na madrugada do dia 24 de dezembro de 2018.
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