Por Gonçalo Duarte Gomes Há 40 anos, na pequena freguesia de Ferrel, ali para os lados de Peniche (muito antes do McNamara celebrizar internacionalmente aquelas bandas), o povo saiu à rua para dizer "não, obrigado" a uma central nuclear que lhe queriam pôr à porta. Passado todo este tempo, parece que temos que mudar a coisa para "no, gracias", vindo provar que Espanha é mesmo um país irmão, e não amigo. É que a família, ao contrário dos amigos, não se escolhe... Nuestros hermanos, ainda recalcados de Aljubarrota e do facto do passatempo domingueiro de vir comprar turcos e atoalhados a Vila Real de Santo António já não ser o que era, não perdem uma oportunidade de nos brindarem com presentes envenenados. Bons exemplos deste carinho Apache que recebemos juntamente com os caramelos e os calamares, são os seus planos hidrológicos, que sistematicamente tentam fechar a torneira das bacias hidrográficas partilhadas com Portugal, e também a sua gestão do tema nuclear que, podendo, empurra tudo o que é lixo para junto da nossa fronteira. O caso mais recente, centrado em Almaraz, prende-se com o não encerramento da central nuclear ali em deficiente funcionamento, e com o bónus entretanto conhecido de também naquele local pretenderem (ou terem já decidido unilateralmente) implementar um aterro de resíduos nucleares. Tudo à beira Tejo, prontinho para transportar até nós qualquer contaminação, com as Portas de Ródão a servir de entrada. Sem entrar sequer na questão da eleição do nuclear como opção alternativa para o abastecimento energético, choca-me a placidez diplomática com que Portugal sempre encara estas situações. Até agora, a reacção mais veemente a que se assistiu foi a do Ministro do Ambiente português, ameaçando boicotar uma reunião com a sua homóloga espanhola, por não estar disponível para ir assar carapaus fritos. Mas depois o Rei de Espanha falou com o nosso Presidente da República, deu umas palmadinhas nas costas, e lá foi o nosso Ministro até Madrid... para lhe dizerem o que ele já estava à espera, e que foi, mais coisa menos coisa, "no te entiendo, y nos vamos a hacer lo que nos da en la real gana". "Y miete-te en la tua vida", terão acrescentado. Ou isso, ou tenho que escolher melhor as minhas fontes... Verdade é que a conversa foi tão porreira que agora vamos apresentar queixa em Bruxelas - que é uma coisa que dá um resultadão - porque não temos capacidade diplomática para fazer valer quaisquer argumentos. Aliás, se a diplomacia fosse um recreio, nós seríamos o pobre choninhas que acaba sempre a levar no toutiço, correndo depois para choramingar junto do contínuo, apesar de sermos um bocado rufias. Isto fica bem provado no recente caso dos filhos do embaixador do Iraque em Portugal, mesmo tendo um Ministro dos Negócios Estrangeiros que até é um bocado trauliteiro. Talvez se o caso lhe tivesse aparecido numa feira de gado, ou pela direita em vez de pela esquerda, tivesse tido mais vontade de malhar... Com este pequeno e ligeiro apontamento quero, justamente, deixar uma palavra de incentivo aos nossos governantes, para que endureçam posições (reverta-se a exportação do Cristiano Ronaldo, se necessário!), e façam valer a posição de Portugal, neste que é um tema da maior seriedade e gravidade, já que os riscos de qualquer ocorrência nefasta são tremendos. No capítulo reivindicativo o Algarve pode ajudar, embalado pelas recentes vitórias parciais noutro domínio energético, mas da revogação dos contratos para prospecção e exploração de hidrocarbonetos. Nisso, e através de um boicote massivo às puntillitas fritas e ao torrão de Alicante, com esta banda sonora clássica...
2 Comments
fernando santos pessoa
17/1/2017 12:11:39
Desde há vários Governos até ao de hoje, que não existe em Portugal uma Politica de Ambiente praticada por titulares com convicções fortes sobre o que deve ser defendido no domínio do OT, da CNatureza ou dos vários parâmetros que condicionam as condições ambientais. Falta convicção e sobeja submissão aos grupos económicos que pretendem apenas obter lucros - mesmo que se delapidem as condições de salvaguarda do equilíbrio ecológico. A inacção perante a
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Gonçalo Duarte Gomes
17/1/2017 17:29:02
Obrigado pelo certeiro comentário, Professor.
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