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Notas de uma quarentena improvável (40)

7/5/2020

2 Comments

 

Eu não quero regressar, quero é avançar!

Por Anabela Afonso

Fecho hoje o ciclo de notas diárias neste período de quarentena. A partir de hoje voltarei ao habitual ritmo de escrita do Lugar ao Sul. Quarenta dias depois de me ter colocado o desafio de escrever diariamente durante estes dias de confinamento.

​Foi, sobretudo, um exercício de auto-disciplina, mas também uma forma de deixar registados os assuntos, as preocupações ou as pessoas que, por qualquer motivo, iam marcando os meus dias. Dias houve em que isso era evidente, outros, porém, dava por mim a sentar-me ao computador sem a mínima pista do que dali sairia. 

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​Não sei ainda a utilidade deste exercício, se é que alguma terá, mas sei que estes são tempos fora do comum, e como alguém escreveu algures, num texto com o qual me cruzei no início do confinamento, daqui a uns anos, termos registos escritos destes dias, ajudar-nos-á a perceber melhor o impacto desta pandemia no quotidiano das nossas vidas.


​Chegada aos 40 dias da quarentena de escrita, fica-me a impressão de que estamos numa espécie de encruzilhada, que nos coloca perante o seguinte impasse: para onde queremos ir depois disto? A pergunta faz sentido, quando damos conta de haver uma espécie de divisão atual, entre os que estão ansiosos por regressar à dita "normalidade" e aqueles que viram nesta experiência extrema a oportunidade para avançar para algo melhor, ou pelo menos diferente.


A necessidade de regresso à normalidade é totalmente legítima, sobretudo quando ela parte daqueles que mais sofrem com os impactos negativos desta crise, por terem perdido trabalho, rendimento e forma de poder cumprir com os seus compromissos e arranjar forma de colocar comida da mesa. Já não a entendo tão bem quando ela parte daqueles que estão apenas ansiosos para voltar a explorar a voragem consumista em que nos estávamos a afundar e que, hoje, mais do que nunca, se tornou evidente que estava a causar enorme destruição ao nosso planeta. Se há apenas 2 meses, recuperar a camada de ozono parecia uma missão impossível, a paragem de muita da atividade humana (sobretudo aquela ligada aos vários tipos de consumos) veio demonstrar que afinal a solução é bem mais simples do que pensávamos, por mais que nos custe a ideia de prescindirmos de alguns dos nossos comodismos.


Não tenho dúvidas que desperdiçaremos uma oportunidade de ouro, se não aproveitarmos esta travagem brusca, que nos foi imposta, para avançar em vez de regressarmos aos erros de antes. E para os que acham que só pode pensar assim que não está a atravessar dificuldades, termino esta minha última nota, recorrendo, mais uma vez, aos livros. Neste caso a um livro que li não há ainda um ano, e do qual me tenho lembrado recorrentemente nestes dias: O Homem em busca de um Sentido, de Viktor E. Frankl, escrito em 1946, e onde, na primeira parte, o autor relata a sua experiência de luta pela sobrevivência numa situação extrema como a de um campo de concentração, e na segunda parte sintetiza, enquanto psicoterapeuta, o método que desenvolveu a partir dessa experiência, e que ficou conhecido como Logoterapia.


Neste seu relato, Viktor Frankl defende que, por mais extrema e dramática que seja a experiência que possamos atravessar, há sempre um limite que nos cabe a nós, enquanto seres humanos, decidir se atravessamos ou não, determinando de que modo passamos por essas experiências, tal como ilustra o excerto seguinte:


​«Nós, que vivemos em campos de concentração, podemos recordar os homens que iam de caserna em caserna para confortar os outros, oferecendo-lhes o último pedaço de pão. Podem ter sido poucos, mas constituem prova suficiente que tudo pode ser tirado a um homem, menos uma coisa: a última das liberdades humanas - a possibilidade de escolhermos a nossa atitude em quaisquer circunstâncias, de escolhermos a nossa maneira de fazer as coisas.
E havia sempre escolhas a fazer. Em cada hora de cada dia, havia oportunidades para tomar decisões, decisões essas que determinavam se iríamos ou não submeter-nos àqueles poderes que ameaçavam roubar-nos o nosso próprio eu, a nossa liberdade interior; que determinavam se íamos tornar-nos ou não um joguete das circunstâncias, renunciando à liberdade e à dignidade para nos deixarmos moldar e transformar no preso típico. [...]
[...]Portanto, de uma forma fundamental, qualquer homem pode, mesmo em tais circunstâncias, decidir o que será feito dele - mental e espiritualmente. Pode manter a dignidade humana mesmo num campo de concentração.»


​Passam hoje 75 anos da rendição da Alemanha nazi, e 80 anos da estreia do filme O Grande Ditador, de Charlie Chaplin, celebrizado com o seu discurso final, que vale a pena continuar a relembrar, sobretudo em dias em que, novamente, teremos que decidir que escolhas queremos fazer. Em cada dia, e a cada hora, que pequenas decisões iremos tomar, nas inúmeras oportunidades que se nos vão colocar. Mesmo quando a opção pela nossa liberdade interior, pareça, no momento, poder tirar-nos o chão, por estarmos a largar o conforto do que conhecemos, trocando-o por um desconhecido que não sabemos o que nos trará.

Desejo ao mundo coragem para avançar e para continuar a acreditar que #Vaificartudobem.

Obrigada por me lerem, ao longo destas Notas de uma quarentena improvável.

2 Comments
Miguel
8/5/2020 11:12:21

Cara Anabela, os seus textos frequentes foram - da minha parte - extremamente interessantes, certeiros, com sentimento, que muitas vezes falta na escrita em geral mais intelectualizada; e não deve obviamente, o sentimento é complemento, não um estorvo.
Por mais que leia, que especule ou que faça cenários, não tenho qualquer certeza do que virá mais a frente, estamos em modo de sobrevivência, procurando viver quando é possível, se possível.
A tão afamada "natureza" humana é uma realidade, fruto da biologia e das experiências individuais e colectivas instituídas pela cultura vigente numa complexa rede, a ideologia politica muitas vezes assume-se mais como uma crença do que propriamente em factos, resultando dai os problemas (nalgumas ideologias mais do que em outras) que conhecemos, porque se acredita em em vez de os factos e dados mostram que.
Dito isto, a "natureza humana" não é nem negra nem cor de rosa é o que é, cinzenta com tons mas escuros ou claros consoante as variáveis, significa isto que o impulso para continuar na mesma, a ideia de conforto associada, a gula, os instintos primários andarão de mãos dadas com o impulso (e conhecimentos) de mudança, a vontade de cooperação, a empatia, etc, esperemos assim que estes últimos prevaleçam pelo menos para instituir as mudanças necessárias, the wolf i feed...bem haja, cordiais cumprimentos!!

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Anabela Afonso
13/5/2020 19:13:36

Caro Miguel, quero, antes de mais, agradecer a presença assídua e leitura atenta ao que ia diariamente partilhando neste Lugar. Quero também agradece os comentários, reveladores de alguém que também olha o mundo com muitas questões, mas não menos sensibilidade, ou sentimento, como bem referiu. Fico feliz que tenha a coragem por assumir que o sentimento é sempre complemento, e não estorvo. Deveria ser óbvio, mas parece que (ainda) não é. Sou das que acredita que os seres humanos são, na generalidade, bem intencionados, acontece é que os mal intencionados são sempre os que ganham visibilidade, acabando por deixar tanta coisa bonita feita por pessoas bem intencionadas na sombra e no anonimato.
Espero que continue bem, e até breve!

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