Por Andreia Fidalgo Gosto de pensar no Natal como uma festividade que se universalizou muito para além do significado religioso que lhe conferiu o Cristianismo. Não me agrada a excessiva mercantilização do Natal da actualidade, nem o consumismo que lhe está associado, nem tampouco toda a exagerada parafernália decorativa, ou o Pai Natal da Coca-cola… Mas, agradam-me muito os valores maiores que transcendem tudo isso: a família, a união, a solidariedade, a esperança, o amor ao próximo. Valores que, de resto, se deveriam manter uma constante durante todo o ano. Nesta altura, prefiro sempre de recordar que as celebrações que agora se fazem são muito anteriores ao significado cristão que posteriormente se lhes atribuiu, e que colocaram no dia 25 de Dezembro o nascimento do Menino Jesus. As festividades de Natal têm uma origem pagã, que remonta ao período romano: o Natalis Invicti Solis (Nascimento do Sol Invicto) comemorava-se por altura do Solstício de Inverno, e celebrava o triunfo do sol sobre a escuridão, pois a partir dessa data os dias começam a ser maiores, atingindo o seu auge no Solstício de Verão. O sol era então celebrado como fonte de energia e de vida, associado ao cultivo da terra e prosperidade das colheitas futuras. Resquícios deste culto pagão podem ainda ser observados nos tradicionais “madeiros” ou “cepos” de Natal que se fazem em muitas aldeias e vilas do interior do país. Nesses casos, acendem-se grandes fogueiras na praça principal ou no adro da igreja, na véspera de Natal; na noite de natal, depois da missa, a população reúne-se em torno do madeiro para se aquecer e festejar. Em algumas localidades, estas fogueiras mantêm-se acesas até ao Dia de Reis. Manter o madeiro durante vários dias corresponde a um ritual de partilha, de união e de confraternização em torno de uma fonte de calor que também é fonte de vida. Desconheço se, actualmente, em alguma terra algarvia ainda se cumpre esta tradição ancestral. José Leite de Vasconcelos (1858-1941), na Etnografia Portuguesa, referia que “no Algarve há o chamado Cepo de Natal”, acrescentando que “em algumas terras é costume visitar-se sete cepos na noite do Natal, para efeito de ficarmos livres, durante o ano, da dor de cabeça” (vol. VIII) – e bem que precisávamos que o próximo ano nos livrasse desta grande dor de cabeça que chegou a todos nós por via da pandemia!
O Natal que este ano se comemora será, para muitos de nós, diferente do habitual. Muitos não poderão estar presentes, ou não terão presentes familiares que querem proteger ou têm de ser protegidos. Muitos ficarão ainda mais solitários, num ano que nos isolou a todos numa bolha e foi tão difícil de enfrentar. Muitos sentirão falta de um abraço e não o poderão ter. Muitos chorarão a perda de um ente querido. Muitos passarão um Natal triste e difícil, porque a pandemia os atirou para o desemprego, mergulhando-os inesperadamente numa crise económica. Uma crise que não é só para alguns, porque nos toca a todos… Não será uma época fácil, nem os tempos que se avizinham nos parecem promissores, num período que se afigura difícil de ultrapassar, com contornos problemáticos que vão muito além de questões de saúde pública. Por isso mesmo, e numa perspectiva de universalização do Natal, parece-me que podemos redescobrir na ancestralidade das comemorações desta quadra festiva uma bela mensagem de esperança: a de que a luz pode triunfar sobre a escuridão; a de que, a cada solstício, se inicia um novo ciclo; a da renovação da natureza, da vida; a da união e partilha… Porque, acima de tudo, não podemos deixar que vençam as trevas, quando temos tanta luz para oferecer ao mundo que nos rodeia. Que possamos contribuir todos para a construção de um mundo melhor, é tudo quanto posso desejar! Um Feliz Natal!
1 Comment
Miguel
24/12/2020 12:49:21
Excelente Texto Andreia, sempre pensei que a celebração inclusivamente por cá fosse de índole celta, proto-celta ou geral aos povos pré cristãos. Boas festas e que o novo ano marque o declínio desta maldita pandemia!!
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