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Monchique, Silves, milhões… medronho até de limões!

29/5/2020

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​Por Gonçalo Duarte Gomes

O fogo que, após lavrar durante uma semana e se extinguir a 10 de Agosto, deixou um rasto de destruição de cerca de 27.000 hectares, divididos entre os concelhos de Monchique e de Silves não teve nada de particularmente original, até porque estava anunciado (ver aqui).

Nasceu de uma ignição – cuja causa é, para o caso e por estranho que possa parecer, perfeitamente irrelevante – e, a partir daí, alimentou-se de material combustível acumulado e de paisagens abandonadas (ver aqui).

Progrediu de acordo com os paradoxais padrões de incerteza que estão associados aos grandes incêndios, foi combatido, dentro do que é possível, com o aparato costumeiro e a mórbida atenção mediática que faz já parte do folclore estival, colocou em perigo pessoas e bens, destruiu vidas ainda que, felizmente, nenhuma tenha ceifado.

Por isso mesmo – e apenas por isso – o seu combate foi considerado um “sucesso”.

Na ressaca, surgiu então algo de completamente diferente: ainda o fumo pairava sobre as paisagens calcinadas, e o Primeiro-Ministro António Costa anunciava a intenção de promover uma reorganização económica para as zonas afectadas, num processo alargado, liderado pela própria Câmara Municipal de Monchique.

Pois bem, no passado dia 21 de Maio, uma nota emitida pelo Gabinete do Ministro do Ambiente e da Acção Climática deu conta da aprovação em Conselho de Ministros de um conjunto de diplomas que versam sobre a temática florestal e da paisagem. De entre esse embrulho, soam particularmente interessantes o regime jurídico da reconversão da paisagem (embora pareça fragilizado por se centrar apenas no critério da perigosidade de incêndio) e o programa de emparcelamento. Para que se possam comentar, terá que se aguardar a sua publicação.

Neste anúncio surgia também a nova da aprovação do prometido Programa de Reordenamento e Gestão da Paisagem das Serras de Monchique e Silves. Tal como a restante legislação deste conjunto, também o programa propriamente dito não está ainda acessível. Mas a nota ministerial detalha um pouco do seu conteúdo. Assim, sabe-se que definirá as directrizes de planeamento e de gestão, as áreas e as acções prioritárias de intervenção e o sistema de monitorização. Mais, terá por objectivo promover uma nova economia, que “valoriza o capital natural e a aptidão dos solos, que promove a resiliência ao fogo e que assegura maiores rendimentos, apoiando a reconversão de culturas e remunerando os serviços dos ecossistemas insuficientemente valorizados pelos mercados”.

São identificadas duas áreas prioritárias de intervenção (“Corredor Verde”, em Monchique e “Serra Nova” em Silves) e três acções prioritárias temáticas, centradas em valorização de linhas de água e gestão de combustível, reabilitação do sistema de socalcos e valorização de sobrantes de biomassa florestal.

A suportar tudo isto, é ainda previsto um envelope financeiro num valor total de 20,5 milhões de euros, para investir até 2039. Dito assim, o valor parece chorudo – desde que não pensemos em bancos, e assim. Diluído por 19 anos, impressiona menos – 1,08 milhões € / ano. Se, numa conta simplista, dividirmos o valor total pelos anos e pela área ardida, dá-nos… 39,9 € / ano / hectare.

Naturalmente a divisão não obedecerá a regras tão básicas quanto estas, e o investimento muito menos. No entanto, serve para demonstrar que desde já todas as boas intenções ficam feridas de um subfinanciamento crónico – embora o investimento público não possa aqui ser tudo.

Uma forma simples de o comprovar é olhar para as matrizes de referência dos custos para as principais operações florestais, elaboradas pela Comissão de Acompanhamento para as Operações Florestais (2015/16, que são as mais actuais), e tentar perceber, ainda que numas contas de merceeiro, e apenas a título indicativo, o que se paga com 40 €.

É, não é?

Mas olhemos para lá do vil metal, para aspectos bem mais positivos.

Desde logo, o assumir da paisagem enquanto conceito operativo de planeamento e gestão. Esta evolução – lógica – em relação ao território permite melhor compreender e relacionar os diferentes aspectos biofísicos e humanos em interacção no espaço (e nem sempre imediatamente perceptíveis), cujo resultado final é, justamente, a paisagem.

Seguidamente, e mesmo não se sabendo grande coisa do conteúdo material deste programa, conhecem-se alguns aspectos parciais das suas fases preparatórias/instrutórias. Concretamente, a Direcção Geral do Território disponibilizou alguns elementos de caracterização que integram este instrumento, que permitem verificar a riqueza da informação disponibilizada em apoio à decisão, que – finalmente! – contempla conceitos como aptidão paisagística (incluindo para agricultura e silvicultura, de natureza variada) ou susceptibilidade à desertificação, considerando fisiografia, demografia, cadastro (impressionante o diagnóstico de 74% dos prédios rústicos serem inferiores a 2,5 hectares, a que se somam 16% compreendidos entre 2,5 e 8 hectares), entre outros factores determinantes. Doravante, a ignorância não poderá nunca servir de desculpa.

Desta análise, resulta também o sublinhar de algo óbvio: o maciço de Monchique e os territórios serranos de Silves, pelas suas características biofísicas e processos associados, enquadram e protegem tudo o que, em todas as direcções cardiais, se situa a jusante. E esse serviço fundamental tem que ser valorizado – obrigatoriamente pela via financeira. Esperemos que este programa seja a forma de introduzir nestas paisagens a remuneração dos serviços de ecossistemas em espaços rurais (já que o Algarve ficou de fora da Resolução do Conselho de Ministros nº 121/2019, de 30 de Julho, relativa à 1ª fase desse programa, e da sua posterior expansão).

De qualquer forma, planos e programas são ferramentas. Quanto melhores forem, maior a facilidade da sua operação e melhores as probabilidades de sucesso na resolução dos problemas a que se destinam. Mas a perícia e a firmeza das mãos que as operam serão sempre os factores decisivos.

Ora o problema em apreço, de perda de dinamismo das paisagens, não é local, nem regional, nem sequer nacional. Toda a Europa – para não alargar mais o âmbito – se debate com a revitalização das paisagens rurais. Ninguém tem soluções perfeitas, milagrosas ou imediatas – fujam de quem o afirmar. E não pode passar apenas pela autarquia ou pelo Estado, até porque, para a transformação da paisagem, são mais determinantes as razões do que as convicções ou intenções. Não se pretendendo a criação de um gulag paisagístico de iniciativa estatal, terá que ser alcançada, como em qualquer paisagem viva e equilibrada, a simbiose entre a iniciativa privada e os interesses públicos vertidos nas estratégias governativas, através de um projecto de futuro que alicie a primeira, que gerará os recursos que permitem sonhar com a materialização dos segundos.

Dito assim, parece muito limpinho, direitinho, escorreito. Na verdade, será um exigente, doloroso, por vezes penoso, e decisivo processo de gestão política, social e económica, de base ambiental.

Neste processo, a Comunidade Intermunicipal do Algarve (AMAL) terá que funcionar como bloco coeso e activo, de pressão e exigência junto do poder central, de forma a espaldar estes dois municípios, garantindo que ao projecto são dadas as necessárias condições para que possa, no mínimo, ter hipóteses de sucesso.

A acontecer, esse sucesso agora ensaiado poderá potenciar caminhos para o desenho de soluções similares que, adaptadas a cada contexto, permitam a outras zonas do Algarve – Serra do Caldeirão, desde logo – enfrentar desafios idênticos. Por isso é importante que a região cerre fileiras em torno deste projecto intermunicipal, entendendo-o como importante pioneiro para outros que se sigam.

Se esta ideia já era fundamental antes, neste tempo pós-COVID e de prometidas mudanças de paradigmas e procura de novas soluções para problemas antigos, mais ainda se torna.

Partidos e pessoas vão e vêm, e a paisagem perdura, indiferente pequenas tricas, porque localizada num plano mais amplo, e operando em horizontes temporais mais alongados. Mas, se no poder local, felizmente, são as pessoas quem mais conta, fatalmente os partidos interferem larga e profundamente em vários processos.

Busílis da questão: Monchique e Silves são municípios geridos por executivos que não são da cor do partido que forma Governo – embora Silves se enquadre no quadrante político de uma das suas muletas parlamentares – nem da cor que domina a AMAL.

Quando estamos a pouco mais de um ano de eleições autárquicas, o que pesará mais: a região, a sua coesão e, mais importante que tudo, o futuro das pessoas e das suas paisagens, ou, pelo contrário, as agendas partidárias e as estratégias de conquista, recuperação ou consolidação de posições no nível municipal?
​
Aceitam-se apostas.
1 Comment
Miguel
29/5/2020 15:50:02

Caro Gonçalo, concordo em absoluto com a sua análise; em qualquer projecto de grande envergadura ou de transformação drástica do staus quo nacional, o principio ver para crer assenta perfeitamente.
Ver para crer, acrescento, considerando desde já as limitações financeiras e as famigeradas fidelidades - ou falta delas - politicas.
Os partidos políticos mais tradicionais vivem num estado de negação consciente, uma vez que se apercebem das suas falhas, da perca de eleitorado crescente, da incapacidade de suscitar novo interesse e militância capaz, mas num exercício muito português adoptam a filosofia do "amanhã logo se vê" porque até amanhã ainda há eleitores, serviços e favores feitos e por receber, a real politik em todo o seu esplendor, isto dito por alguém que considera os ditos partidos como forças essenciais para a sociedade, que sendo essenciais são um espelho da mesma.
Os planos apresentados parecem bastante razoáveis nas intenções e tal como referiu se cabe ao Estado porventura o principal papel, os privados, empresas, produtores, enfim, o tecido social não pode ser deixado de fora, pois é ele que vai tirar partido e moldar o que venha a sair dos planos anunciados, e que são de vital importância não só para a viabilidade das regiões, mas também dos seus arredores.
Referiu também a serra do Caldeirão, que muito beneficiaria com um plano de enriquecimento florestal (excluindo exóticas e introduzindo autóctones extintas ou muito raras) e que assim poderia fornecer mais serviços florestais do que aqueles que já fornece, e resumidamente, contribuir para o desenvolvimento local das regiões que dita serra atravessa.
Não consigo perceber como uma aposta nestas medidas que seria ganha à partida é constantemente ignorada, sem isto, soluções só mesmo no papel.

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