Por Luís Coelho Dados do Banco de Portugal mostram que um euro comprava 274.239 Kwanzas no dia 10/05/2018. Foi pois a esta taxa de câmbio que a nossa “justiça” vendeu a honra do mais antigo Estado-Nação do mundo ocidental. É simplesmente inaceitável o que se passou nesta fatídica data. A saber: é em 10/05/2018 que um tal de Cláudio Ximenes (dizem que é juiz) decidiu contrariar a decisão do Tribunal de Primeira Instância, enviando em sede de recurso o processo que envolve Manuel Vicente para Angola (ver aqui: https://observador.pt/2018/05/11/quem-e-o-juiz-que-mandou-o-caso-de-manuel-vicente-para-angola/). Para fundamentar tal “decisão”, Ximenes sustenta-se nos princípios da “boa administração da justiça, da reinserção social em caso de condenação e no regime jurídico mais favorável para o suspeito.” Como? Mas já não há vergonha na cara?
Não sendo jurista, permito-me recordar dois aspectos que me parecem importantes neste contexto. Primeiro: o Manuel esta(va) acusado em Portugal do crime de corrupção activa de um magistrado do Ministério Público, de seu nome Orlando Figueira (parece que está a ser julgado: alguém acredita??). Junta-se a este miminho suspeitas de crimes “menores” como o branqueamento de capitais e falsificação de documentos (ver aqui: https://observador.pt/especiais/o-que-levou-a-acusacao-de-corrupcao-contra-manuel-vicente/). Segundo: o Manuel parece gozar de um regime de imunidades materiais e processuais em Angola, o qual lhe garante que só lá para 2022 é que o seu caso poderá eventualmente chegar à barra da justiça nesse país (ver aqui: https://www.publico.pt/2018/01/24/politica/noticia/angola-propos-compromisso-a-portugal-1800575). Para um leigo, resulta do parágrafo anterior que a “justiça” portuguesa acha razoável enviar para Angola um processo onde o suspeito de corromper um Magistrado Público!!!! da Nação goza de um regime de protecção que lhe garante continuar ao sol até, pelo menos, 2022. Estou certo que esta é a definição perfeita de “boa administração da justiça”. Mais, fico com a impressão que o tipo que assinou a decisão é da opinião que os Nacionais deste País (muitos deles contribuintes) estão deveras preocupados com o problema da “reinserção social” do arguido em caso da sua condenação, ao ponto de não estarem nada interessados no apuramento cabal de TODAS as responsabilidades e implicações desta enorme bagunça. Sinceramente... Que raio de justiça é esta? Alguém ainda acredita ou tem respeito por um sistema que sistematicamente (parece) protege(r) os Salgados, os Oliveiras e Costas e os Rendeiros desta vida? Como é de bom costume, deixo o melhor para o fim: a reacção dos politiqueiros nacionais à notícia. Esta rapaziada costuma ter tacto na forma como lida com assuntos quentes. Desta vez não. Perderam completamente a compostura e deixaram cair a máscara. De facto, em face da gravidade do tema, impunha-se o lacónico “a política não comenta decisões da justiça”. Era também aceitável o lugar-comum “à justiça o que é da justiça”. Mas não. A opção foi bem diferente: regozijo total e absoluto com o texto assinado pelo punho do tal de Ximenes. Por exemplo, Santos Silva – que é responsável pela relação de Portugal com o exterior - afirmou: “Esta decisão, encerrando um 'irritante', permite que a relação entre Portugal e Angola passe para o nível mais alto possível do relacionamento.” Já Costa vai mais longe quando sem pejo afirma “Fico feliz que o único 'irritante' desapareça”. Até o impoluto Marcelo não escapa ao vírus, afirmando no afã do dia que “Desaparece o 'irritante' […] sempre achei que os países estavam vocacionados em encontrarem-se e espero que assim aconteça e que nós possamos fazer em conjunto um percurso que é um percurso importante para o povo angolano e para o povo português.” Inacreditável a forma como os supostos representantes do meu País não se conseguem conter. Já agora, a Visão recolhe várias reacções a esta situação aqui: http://visao.sapo.pt/actualidade/portugal/2018-05-11-Caso-Manuel-Vicente-Do-irritante-a-demissao-da-justica-portuguesa, sendo que, para mim, mais equilibrada é da lavra de Ana Gomes, Eurodeputada do PS. Perceberão que o sentimento que me assola é de profunda revolta para com um sistema que não respeita a memória de todos os que lutaram para aqui chegarmos. Não podemos ter uma sociedade onde o interesse económico de alguns se sobrepõe a um dos princípios básicos e basilares da democracia: justiça igual PARA TODOS. Não podemos ter um sistema onde a Política se mistura com a Justiça. Há, pois, muito a fazer.
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