Por Bruno Inácio Existe em Olhão um restaurante, o Bioco, que utiliza na sua promoção uma frase recorrentemente: Mais Amor Por Favor. Todos sabemos que nas bandas do sul, numa versão muito nossa da visão europeia dos eurocépticos do norte, somos convocados para um modo de vida menos agitado e mais propício ao sentimento maior.
Já pela capital do centralismo, Lisboa, que coitada tem de acolher os que com falta de visão periférica combatem diariamente a descentralização, o amor é mais um sinal do quanto nós algarvios (e o resto do país) somos cada vez mais paisagem e Lisboa é cada vez mais Lisboa. "Descobriram, ao fim de 30 anos, que sou incompatível com a minha mulher", exclamou Pedro Siza Vieira quando confrontado com o facto da sua esposa dirigir a Associação de Hotelaria de Portugal, uma área que o agora ministro da Economia tutela. (Curiosamente não vi nenhum tweet da Fernanda Câncio a se insurgir por esta forma possessiva de um ministro tratar a sua esposa. Devia estar distraída, graças A Deus!). O tom jocoso, muito ao jeito do nosso Primeiro-ministro, que nos vai levando neste embalo do engraçadinho, é neste caso bem conseguido, mas coloca a nu, mais uma vez, um dos problemas estruturais deste País: existe cada vez mais Amor por Lisboa, onde tudo está e onde tudo está cada vez mais, e existe cada vez menos amor pela paisagem, ou seja, por tudo o resto que não é Lisboa. Talvez por isso, uns divórcios (figurativamente falando – fica a ressalva, não vá alguém pensar que desejo o mal matrimonial a alguém!) fizessem bem ao processo de igualdade territorial que o País tanto precisa. Tome-se o exemplo do Ministro Pedro Siza Vieira porque ele é bem paradigmático do que é hoje a concentração de poder, a todos os níveis, em Lisboa. Pedro Siza Vieira, enquanto Ministro-adjunto terá reunido com a empresa chinesa China Three Gorges (maior accionista da EDP, que entretanto lançou uma OPA sobre a eléctrica), apesar da empresa ser assessorada pela Linklaters, sua antiga sociedade de advogados, onde era managing partner. Os casos não se ficaram por aí. Empresas de áreas tão distintas como a TAP, Fertagus, Metro do Sul, Metro do Porto, ou hospitais do grupo chinês Fosun, são outras que o ministro acabaria por fazer saber que não deveria acompanhar processos ou tomar decisões pois estas haviam sido suas clientes. Hoje como Ministro de Economia, e depois da pasta da energia ter passado para outro ministério (hoje fazem-se ministérios à medida da pessoa quando se deveria escolher pessoas à medida dos ministérios), surge a polémica com a sua esposa (é assim Fernanda Câncio, certo? Obrigado!) que para além de liderar a Associação de Hotelaria de Portugal foi adjunta da presidência do Conselho de Administração da Amorim Turismo e directora-geral do Turismo. Estão a acompanhar toda esta teia? Efectivamente não é fácil. Não quero com todo este texto particularizar a questão de Pedro Siza Vieira. Quero antes generalizar uma prática que mostra de forma clara que todo o poder político, económico e social vive e se alimenta em torno da capital. Naturalmente que o Ministro não tem culpa da sua esposa ter sido o que foi ou ser o que é, mas a concentração de poder em todas as áreas é tanta na capital que porventura seria preciso fazer um casting (será que aqueles novos especialistas do amor da SIC não podiam dar uma ajuda!?) para os ministros, secretários de estado, directores gerais, etc. etc. etc. não serem incompatíveis com qualquer pessoa. Esta oligarquia e este nepotismo, como Miguel Morgado acusava há dias este Governo de ser (mas que não é só deste governo, apesar do acentuado número de casos que o envolvem), tem terreno fértil para crescer e fazer caminho. E quanto mais a teia se adensa maior é a desfaçatez e o descaramento, empurrando cada vez mais os limites para o campo do inaceitável. O caso recente da legislação aprovada para o alojamento local é um bom exemplo da falta de visão periférica de quem povoa os gabinetes das decisões. Uma lei feita exclusivamente à imagem e necessidade de Lisboa para servir Lisboa. Nem o Porto parece querer avançar para a aplicação das chamadas zonas de contenção. A realidade do turismo existe no Algarve e na Madeira há décadas e estas regiões aprenderam a viver com as suas vicissitudes. Nunca antes houve a preocupação em legislar para acautelar os problemas de habitação de quem vive nestes duas regiões. Exemplos não faltam. A palavra Algarve é praticamente inexistente na proposta de Orçamento de Estado para 2019, o que seria de estranhar não fosse esse um padrão dos últimos anos, notava, e bem, há dias, o Deputado José Carlos Barros. Resta-nos procurar dirimir, onde for possível e onde estiver ao nosso alcance, este “monstro” que se auto-sustenta. #maisamorporfavor é o que se pede aqueles que têm o dever de gerir um país e não apenas uma metrópole, Mas que tantas vezes se esquecem disso.
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