Por Luís Coelho. Quem me conhece sabe que tenho dificuldade em ver o mundo por outras lentes que não as de um Economista. É uma limitação. Eu sei. Talvez por isso me abespinhe quando as instituições internacionais decidem falar sobre o nosso País. Ora, ontem tivemos Ángel Gurría, secretário-geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) em Lisboa a apresentar em pleno Ministério das Finanças um relatório desta instituição sobre o nosso país. Num tom que alternava entre o modestamente simpático e o grave Gúrria (cudos por se ter esforçado para falar em Português) dizia aos nossos governantes máximos algo que traduzido para linguagem comum soaria como “Rapaziada, o esforço até é simpático, os resultados notáveis mas é preciso mais. Muito mais.” E precisamente neste momento pensei “E se Gúrria e a OCDE fossem...” Vamos a alguns factos. Tal como Gúrria relembrou durante a sua apresentação, Portugal prepara-se para anunciar formalmente um valor para o deficit público em percentagem do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016 muito perto dos 2%. Este é um resultado verdadeiramente histórico, nomeadamente se olharmos para o que aconteceu no período pós-25 de Abril. É de relembrar que no início do ano TODAS as intuições internacionais, carregadas de sábios e bruxos com bolas de cristal infalíveis eram unânimes ao dizer que tal seria simplesmente impossível. Notem, também eu pensei que seria difícil alcançar este objectivo tendo em conta a situação de partida e o que o governo pretendia fazer. Não sendo este o resultado que nos interessa (de facto, precisamos de chegar a uma situação de superavit nas contas do estado) é algo que merece bem mais do que uma nota de rodapé numa intervenção de um alto responsável internacional que fala num país que passou (e está a passar) pelo que nós, Portugueses, bem sabemos. Depois há ainda a questão da performance do sector exportador da nossa economia. O secretário-geral da OCDE referiu (e bem) na sua apresentação que hoje em dia o peso das exportações no PIB ascende a 40%, valor que compara com 27% há apenas dois anos atrás. Podemos discutir se o cabaz que exportamos é o que mais nos interessa. Podemos também achar que 40% é pouco. Ainda assim, a dinamização do sector exportador do nosso País é também facto muito relevante e que poucos entendiam como possível há bem pouco tempo. Logo, é matéria que merece um verdadeiro destaque e não uma mera referência en passant no discurso de Gúrria.
Tomemos agora os remoques do costume. Durante a sua intervenção, o Angel Gurría “alertou” o nosso governo para três aspectos centrais: problemas com o sector financeiro (onde se inclui a questão do crédito mal-parado), a baixa qualificação da mão-de-obra e a disparidade de rendimentos. Dificilmente precisamos de um alto funcionário de uma instituição supra-nacional para saber que a população nacional tem problemas ao nível das suas competência e formação. Há anos que o País luta contra esta situação, com sucessos limitados (quanto a mim muito mais teria de ser feito, nomeadamente a introdução de uma verdadeira cultura de exigência nos mecanismos de formação que existem por troca com o facilitismo que, em função da pressão dos números, vai abundando). Por outro lado é totalmente líquido para a maioria dos meus concidadãos que existe uma disparidade inaceitável no que toca à distribuição de rendimentos no País. Infelizmente, a última crise veio agravar a situação sendo que não vejo no discurso de Gúrria ideias claras sobre o que fazer para resolver a questão (qualificação da mão-de-obra, sistemas de remuneração desenhados em função da produtividade – no sector privado e público, combate sem quartel à corrupção, justiça a funcionar em condições, entre outras). Quanto à situação da banca só lamento que a OCDE não tenha dado uma mãozinha ao País na altura de negociar o valor e condições do resgate com a Troika. De facto, teria sido importante ter tal parceiro connosco a exigir (sim, a palavra é mesmo esta) mais dinheiro para resolver um problema que era conhecido de todos mas que muitos acharam por bem colocar debaixo do tapete. Mais haveria a dizer mas este post já vai longo. Termino pois com uma pérola do secretário-geral da OCDE. Nas palavras de Gúrria, devemos caminhar no sentido de ter uma "globalização mais justa e inclusiva, em geral, e em particular em Portugal". Imagino que Gúrria não veja televisão ou que prefira fazer fast forward quando se fala de Trump e da sua visão para o mundo. Imagino, também, que prefira ignorar os efeitos que a “globalização” que temos vindo a ver tem tido sobre o ambiente (a China é uma catástrofe ecológica de escala inimaginável; e, infelizmente, está bem acompanhada por outros BRICS) e sobre o bem-estar de uma parte muito considerável da população das chamadas economias desenvolvidas. Logo, globalização sim desde que todos apliquem as mesmas regras E que ninguém coloque o interesse de um país em particular à frente das preocupações que todos temos de ter para com o planeta. A geração actual e, sobretudo, as vindouras agradecem.
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