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Fenómeno Turístico: o exemplo da resiliência da região do Algarve

29/10/2019

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Por Luís Coelho
Não raras vezes os escribas deste Lugar ao Sul chamaram a atenção para as consequências nefastas de termos a economia Algarvia centrada no fenómeno turístico. Eu próprio, acérrimo defensor da necessidade de revermos tal situação, abordei este tópico neste e noutros fóruns. Sou, no entanto, forçado a reconhecer que o sector turístico é, de facto, um caso de surpreendente resiliência no nosso algarve, o qual deve ser observado com estima.

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Saias, Modas e Ódio, ou como as palavras também matam.

28/10/2019

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Por Anabela Afonso

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As palavras são uma arma, já o sabemos, mas poucas vezes pensamos que são as nossas palavras, ou ausência delas, que podem estar a ferir aqueles que estão em nosso redor. Sim, porque as nossas palavras são sempre as certas, as que são justas. Os que erram são sempre os outros.

Vem isto a propósito de uma série de coisas que vi e li, nestes últimos dias, que me puseram a pensar na facilidade com que dizemos/escrevemos certas coisas, sem nos dar conta do impacto que isso terá no(s) outro(s), ou, no outro extremo, na facilidade com que deixamos de dar às palavras o verdadeiro sentido que elas têm, ou que passamos a utilizar modos mais suaves de descrever realidades que é nossa responsabilidade não deixar que se normalizem.

A este propósito, escreveu o jornalista Vitor Belanciano uma notável crónica, intitulada Estás na Moda ou na Merda?, cuja leitura aconselho, por, a partir das muitas análises que se multiplicaram sobre o filme Joker, nos levar a refletir sobre este fenómeno a que todos cedemos de aceitar normalizar a miséria, a pobreza, e a falta de opções para tantos de nós, como se não houvesse saída. Mais grave ainda é o facto de os únicos que apontam saídas e soluções milagrosas para estes problemas serem os populistas e demagogos, que não hesitam em tentar convencer-nos que tudo isso se resolve, atirando para dois ou três alvos - o velho truque de identificar um "inimigo" sobre quem recaem todas as responsabilidades dos nossos males.

Ora grandes males nunca têm grandes remédios nem grandes soluções. A verdade é essa. E esses que se apresentam com soluções simples não fazem mais do que utilizar a arte da manipulação e da propaganda para agitar as massas a seu favor (que na grande maioria das vezes não é mais do que a chegada ao poder e uma vez lá chegados, a sua preservação). Aqui não posso deixar de sugerir que sigam o documentário que há três semanas estreou no canal Discovery, da autoria do realizador Steven Spielber, Why We Hate. Nesta série de 6 episódios, Spielberg vai buscar uma série de cientistas, investigadores, jornalistas e outros especialistas, assim como testemunhas diretas de situações de violência que marcaram o mundo nos últimos anos, para tentar encontrar uma explicação que justifique porque, em alguns momentos, os homens são capazes de atos de enorme atrocidade para com os seus semelhantes. O terceiro episódio, que passou este domingo, dia 27 de outubro, centrou-se no papel central que a propaganda teve em alguns dos episódios mais negros da história da humanidade, como foi o caso do holocausto, ou o genocídio do Ruanda em 1994, demonstrando a facilidade com que, através da repetição intensiva de mentiras e ideias cheias de preconceito, se consegue desumanizar um determinado grupo de pessoas, ao ponto de um outro grupo já não as considerar humanas, e assim conseguir aceitar como justificável que sobre eles se pratiquem os mais bárbaros atos de violência. A dada altura é referido o papel que os media, e as redes sociais têm nos dias de hoje, nestes fenómenos, explicando que, apesar de são serem muitas vezes aí que eles surgem, é sem dúvida nenhuma aí que, nos nossos dias, eles se amplificam a uma velocidade muitas vezes assustadora.

A ilustrar esta referência ao perigo da disseminação do ódio, através das redes sociais, deixo, por fim, como sugestão, a série A Vítima que passou recentemente na RTP 2, que tem como ponto de partida a brutal agressão de um homem, após ter sido identificado num post numa rede social, como sendo um assassino.
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Tudo isto são temas que nos fazem pensar no perigo que representa vivermos numa sociedade que não promove o sentido crítico, e onde a propaganda, as notícias falsas e os títulos flashantes que asseguram cliques nas páginas dos jornais e dos sites de conteúdos começam a ganhar um poder assustador, perto dos poucos santuários que ainda nos vão fornecendo informação fidedigna, isenta, e com dados credíveis. Esta é uma situação tanto mais preocupante, quanto mais percebemos que mesmo aqueles de nós que se interessam por discutir ideias e conteúdos sobre tudo o que diga respeito às nossas cidades, ao nosso país e ao mundo onde vivemos, se confrontam com cada vez mais dificuldade em trespassar a cortina diária de assuntos sem interesse que ocupam o espaço mediático, impedindo que verdadeiramente consigamos olhar para o estado do mundo em que vivemos. Exemplo disso foi toda a agitação que se gerou em torno de uma peça de roupa que uma pessoa decidiu levar para o dia da tomada de posse dos novos deputados. Como é que uma coisa sem importância nenhuma se torna a coisa mais importante de um dia que tinha, de certeza, coisas bem mais importantes a destacar? E porque deixamos nós que isso aconteça, alimentando o acessório, e deixando morrer à mingua de atenção o essencial? Sim, as palavras são uma arma, mas é cada um de nós que, em última instância, decide se lhes damos o poder de se tornarem letais, ou se optamos, antes, por apenas amplificar aquelas que podem verdadeiramente fazer deste um mundo melhor.

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Ai se S. Siza aparece no Algarve...

25/10/2019

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Por Gonçalo Duarte Gomes

Santos da casa não fazem milagres, já diz a sabedoria popular.

Vai daí, e embora neste Lugar não existam santos, e se vá tentado falar de coisas boas e menos boas deste nosso Algarve, com o tema do turismo quase sempre à vir à baila, pouco efeito surte, por muita propriedade que os argumentos apresentados tenham.

Tal como a torrada que cai sempre com a face amanteigada no chão, é assim, nada a fazer.

Por isso mesmo, nada como invocar outras santidades, de renome, daquelas a que até as eminências pardas do provincianismo regional gostam de dar ouvidos, ainda que a mensagem lhes seja tão compreensível quanto um palácio para um boi.
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Saúde no Algarve: Quando será que nos sai o Joker?

14/10/2019

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Por Anabela Afonso

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No passado dia 10 de outubro assinalou-se o dia mundial da saúde mental, tema que provavelmente não é muito propício a grandes parangonas nos jornais e das televisões de maior audiência. Não deixou, contudo, de ser notícia aqui e ali, alertando-nos para uma realidade, que, não estando presente no quotidiano de muitos de nós, é uma realidade que a qualquer altura nos pode bater à porta, direta ou indiretamente, e para a qual devíamos, todos, estar mais despertos.

Noticiava, por exemplo, o Público, que o Algarve e o Alentejo têm, neste momento, apenas 3 pedopsiquiatras, para lidar com crianças e jovens. No mesmo dia sabia-se também que, de acordo com os registos contabilizados até 2017, a taxa de suicídio entre os jovens é a maior dos últimos 10 anos. Se isto não são dados que nos deviam por a todos com os cabelos em pé, então qualquer coisa de muito grave se anda a passar connosco.

É verdade que, no Algarve, aproveitando o ambiente de campanha eleitoral, não faltou quem se queixasse uma e outra vez, de como estamos esquecidos no que toca à saúde. Mas sabemos que no Algarve contamos pouco, para que aqueles que, em Lisboa, tomam em mãos os destinos do país, olhe para nós com olhos de ver. Podemos gritar à vontade, porque no final de contas somos apenas uns milhares de votos que não elegem ninguém (ou pelo menos ninguém que nos faça sentir que o nosso voto faz alguma diferença), esquecendo-se, quem decide, que o Algarve nunca é só as 400 mil almas que cá residem, mas sempre, pelo menos, o dobro disso, quando não o triplo, com a quantidade de turistas que durante todo o ano por cá passam, e com os quais temos que partilhar os vários recursos da região, entre os quais as estruturas e os profissionais de saúde.

E se não nos serve de nada queixarmo-nos de que não temos ortopedistas, oftalmologistas, otorrinolaringologistas, dermatologistas e outras especialidades, daquelas básicas que tratam das mazelas que quotidianamente podem atacar qualquer um que por cá ande (seja residente ou turista), imagine-se se alguém se vai lembrar que o Algarve também precisa de psiquiatras, quando desses será mais difícil falar.

O enorme estigma social associado à doença mental ainda faz com que esta seja uma realidade vivida na sombra, de modo isolado, sem se partilhar, e fazendo os possíveis para que não se saiba fora da bolha familiar (e às vezes nem nessa).

Mas não pode ser. Alguma coisa se tem que fazer e a primeira é assegurar que temos um Serviço Nacional de Saúde com os recursos necessários para dar resposta a quem precisa (residentes e visitantes), e que consiga chegar a quem precisa, sem que seja necessário gritar, ou cometer algum ato de loucura.
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E se todos os estudos e dados oficiais que já existem sobre a realidade do país, e do Algarve em particular, não chegam para percebermos o que pode acontecer quando começamos a deixar de conseguir dar resposta aos que precisam, e aos que não conseguem resolver as contingências de um contexto social e mental adverso sozinhos, isolando-os cada vez mais e encostando-os cada vez mais a uma marginalidade sem saída, então só posso deixar um conselho a quem viu agora renovada a responsabilidade de gerir o país por mais 4 anos: Vão ao cinema!

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O Algarve como um Reino à parte: da “odiosa diferença” à odiosa indiferença?

11/10/2019

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Um dos aspectos mais gratificantes nesta ideia do Lugar ao Sul é verificar o carinho com que é recebido por tantas pessoas. Quando a esse carinho se junta entusiasmo e generosidade, dessa mistura nascem momentos felizes como o de hoje, em que este canto, deste Lugar, recebe a visita de alguém como a Andreia Fidalgo.
Aceitando um desafio lançado quase em jeito de provocação, a Andreia vem aqui partilhar um olhar sobre o presente e futuro do Algarve, contido não apenas nas suas fronteiras, mas para lá delas plenamente projectado e afirmado, enquanto parte relevante de um todo bem maior. Um olhar solidamente alicerçado num conhecimento e entendimento profundo do seu passado, fruto de alguma da mais notável e eloquente investigação histórica produzida não apenas a Sul, mas em horizontes bem mais vastos.  
Resta apenas agradecer a sua generosa partilha.

Gonçalo Duarte Gomes
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Por Andreia Fidalgo

​Há algum tempo, numa troca de ideias sempre estimulante com o Gonçalo Duarte Gomes sobre a minha tese de doutoramento em curso, achou ele por bem lançar-me a provocação de partilhar aqui, no Lugar ao Sul, algumas reflexões que estabelecessem a relação entre os meus temas históricos e o Algarve dos dias de hoje. Achei o repto interessante e pertinente, sobretudo porque defendo convictamente a ideia de a História, enquanto área disciplinar, tem uma importância que vai muito além da aquisição de conhecimentos sobre um determinado acontecimento ou personagem históricos; o estudo da História permite ao cidadão actual assumir uma atitude crítica face ao seu próprio tempo, na medida em que lhe permite posicionar-se mais esclarecidamente no presente, com consciência do passado e da herança histórica que o (en)forma. Não poderia, pois, recusar este desafio.

A referida tese de doutoramento trata das reformas económicas de inspiração iluminista que foram implementadas na região algarvia entre as últimas três décadas do século XVIII e as duas primeiras do século XIX, ou seja, nos últimos 50 anos do Antigo Regime em Portugal. O primeiro impulsionador destas reformas foi o Marquês de Pombal e, na realidade, o caso de estudo algarvio já de si muitíssimo interessante, é-o ainda mais se relembrarmos a sua singularidade, pois trata-se da única região portuguesa que foi alvo de um plano específico de actuação reformista por parte da Coroa. E porquê a única? Longe do que seria de esperar, a súbita atenção do Ministro de D. José à região não foi somente motivada pelo alarmante estado de subaproveitamento crónico das potencialidades económicas algarvias; também o foi, é certo, mas o que preocupou verdadeiramente Pombal foi o facto de se ter apercebido que existia, em pleno reino, uma parcela de território praticamente isolada, que vivia o seu quotidiano quase sem lei nem rei, cujos proventos económicos escapavam praticamente por inteiro ao Erário Régio e estavam, em parte, nas mãos de interesses estrangeiros. Situação verdadeiramente inconcebível perante um Estado que se queria forte, coeso e, em suma, Absoluto.

Os diagnósticos realizados à época evidenciavam os mais diversos problemas económicos, em distintos domínios. A abundância das pescarias, sobretudo de sardinha no sotavento algarvio, era amplamente explorada por uma comunidade de catalães sediada na praia de Monte Gordo, porém, os impostos desta actividade tão lucrativa escapavam quase por inteiro aos cofres da Coroa; já as almadravas, destinadas às pescarias consideradas reais ou privilegiadas – isto é, ao atum e à corvina –, e cujos lucros revertiam directamente para a Coroa, estavam em estado de ruína e abandono desde o terramoto de 1 de Novembro de 1755. Da agricultura, essencialmente mediterrânica, obtinham-se escassos rendimentos, uma vez que os lavradores que exploravam as propriedades fundiárias estavam sujeitos a elevados encargos financeiros devido aos contratos usurários ilicitamente estabelecidos pelos senhorios. Quanto ao comércio, essencialmente sustentado pelos frutos regionais – tais como o figo, a amêndoa, a alfarroba, a laranja da China (doce), aos quais acresce a cortiça – tinha em Faro o seu principal centro de actividade e encontrava-se sob o monopólio de homens de negócios ingleses, logo, nas mãos de interesses alheios à região.

Assim, apesar das imensas potencialidades da região algarvia, com a sua agricultura mediterrânica e as suas abundantes pescarias, quando a Coroa Portuguesa voltou para ela o seu interesse deparou-se com um território ruralizado, economicamente deprimido, marcado por um processo de decadência que se tinha progressivamente acentuado desde finais de Quinhentos, altura em que a região deixara de suscitar o interesse da Coroa por ter perdido a sua função estratégica de apoio às praças portuguesas do Norte de África. Um território marcado, também, por uma acentuada desigualdade social, na qual predominava uma elite local essencialmente composta pela “gente nobre da governança da terra” e pelo clero prebendado, que para além de ocupar, respectivamente, os cargos de administração concelhia e os cargos diocesanos, constituía também o mais rico grupo da região, com uma riqueza proveniente da posse das terras, que dominavam e davam a explorar mediante o estabelecimento de contratos contrários às leis em vigor.

Não cabe aqui referir pormenorizadamente todas as medidas reformistas que então o Marquês de Pombal iria implementar para inverter o estado de estagnação económica da região algarvia, num plano coerente e bem desenhado, descrito na própria época como a “Restauração do Reino do Algarve”. Bastará referir que, para incentivar as pescas no sotavento algarvio, para aumentar a capacidade de fiscalização do Estado, e para incrementar uma indústria tradicional de beneficiação da sardinha, se vai fundar, na margem direita do Guadiana, voltada a Espanha, Vila Real de Santo António, sem qualquer dúvida o testemunho mais visível no território do projecto pombalino de “Restauração”. Bastará também relembrar que, para animar as pescarias reais, se substituem as antigas almadravas pela Companhia Geral das Reais Pescarias do Reino do Algarve, a última das grandes companhias monopolistas pombalinas a ser criada. Ou, bastará ainda recordar que, para fazer frente às desigualdades da sociedade algarvia e ao poder da elite local, se vão implementar medidas que procuravam acabar com os contratos usurários que ilicitamente se praticavam na região.

No entanto, houve uma medida pombalina que foi absolutamente notória a todos os níveis, quer pelo facto de ser transversal a vários domínios económicos, quer pelo profundo significado histórico que encerra para o Algarve: a lei de 5 de Fevereiro de 1773, que procurava abolir a “odiosa diferença” entre o Reino do Algarve e o Reino de Portugal no que respeitava aos impostos cobrados. É que, até à data, os produtos que saíam da região para o restante Reino de Portugal, assim como os que entravam, pagavam impostos mais elevados, idênticos aos produtos de um/para um qualquer reino estrangeiro. Como se o Algarve fosse, de facto, um reino à parte. Ora, esta medida legislativa encerra em si um significado muito mais amplo, na medida em que deixa transparecer uma região com as suas idiossincrasias, com as suas particularidades e com uma identidade muito própria. Uma região simbólica e honorificamente designada por “Reino”, após a conquista definitiva por D. Afonso III, em 1249, sem nunca o ter sido efectivamente; uma região que pelas suas condicionantes geográficas específicas possui uma delimitação fisicamente visível do restante território português, com uma extensa serra a norte, o rio Guadiana a Este e o Atlântico a Oeste; uma região que precisamente por causa das suas condicionantes históricas e geográficas específicas, se viu atreita a um relativo isolamento, que se reflectiu que na forma como os “de cá” viviam, não raras vezes à margem da lei, mas também na forma quase exótica com que era encarada pelos “de lá”, isto é, pelos que viviam no Reino de Portugal. Afinal de contas, até a correspondência expedida do Algarve e para aqui dirigida pagava os mesmos portes de envio que a do vizinho Reino de Castela!

O projecto de “Restauração do Reino do Algarve” empreendido pelo Marquês de Pombal foi, assim sendo, a primeira grande tentativa de esbater as fronteiras económicas – mas, em última análise, também identitárias e culturais – que separavam o Reino do Algarve do restante Reino de Portugal. Os problemas da sua eficácia (ou falta dela) são tema para a tese de doutoramento em curso, mas cabe aqui ressaltar, pelo menos, os esforços empreendidos pelo Estado, naquele período de ilustração, para melhorar a situação económica da região e para resolver vários dos problemas de que esta sofria, integrando-a no restante Reino de forma mais justa e equilibrada. Ora, neste sentido, e dando um salto de cerca de 250 anos até aos dias de hoje, cumpre relembrar o quão afastados nos encontramos desse período em que se procurou eliminar a “odiosa diferença” de que padecia a região, e cumpre questionar se não nos encontramos mesmo numa época em que os problemas que actualmente a afligem são quase olhados com uma odiosa indiferença por parte da classe dirigente.

Tentar comparar realidades económicas tão distintas como a do Algarve dos finais do Antigo Regime e a do Algarve dos dias de hoje, quase inteiramente absorvida pelo turismo, seria certamente um exercício supérfluo para a ocasião. O que não é, talvez, um exercício desprovido de sentido, é o de procurar reflectir sobre a forma como a região tem sido sucessivamente encarada pelo Governo nos últimos anos, diria mesmo décadas. Não é de todo despiciendo pensar numa região que reivindica, ano após ano, cuidados de saúde mais condignos para os seus habitantes, ou transportes públicos que consigam, de facto, corresponder às necessidades da população local, dos que nos visitam, e às especificidades do território, ou melhores e mais capazes infraestruturas viárias – apenas para mencionar alguns problemas estruturais! – e que ano após ano vê as suas reivindicações passarem muito ao largo de qualquer agenda política. Não é de todo despiciendo pensar numa região que tem um papel tão relevante no sector turístico nacional, mas que o turismo, per se, não se auto-sustenta se não for acompanhado de uma estratégia de desenvolvimento regional sustentável, de incremento de outros sectores económicos (agricultura, pescas, indústria), de melhoria da capacidade de resposta dos serviços, de desenvolvimento de infraestruturas públicas e privadas, a vários níveis – o que beneficiaria tanto os que cá residem, como os milhares que anualmente nos visitam.

Por isso, questiono se não estaremos hoje, e se não temos estado nas últimas décadas, perante uma odiosa indiferença do Governo para com a região? E questiono, também, se essa indiferença não contagia, como uma outra face da mesma moeda, a própria população algarvia? Basta invocar aqui as percentagens da abstenção nas eleições do passado dia 6 de Outubro: no distrito de Faro, a abstenção atingiu os 54,2%, empatada com o distrito de Vila Real e só superada, em Portugal continental, pelo distrito de Bragança, que chegou aos 55,1%. Valores percentuais estes que ficam bem acima da média nacional, já de si elevadíssima, de 45,5%.  Ainda que pudéssemos entrar aqui em discussão algo complexa sobre o(s) significado(s) da elevada taxa de abstenção, não poderemos também, eventualmente, olhar para estes valores como um sintoma da indiferença generalizada da população algarvia perante a falta de alternativas eleitorais e perante a permanente falta de soluções para os problemas regionais, legislatura após legislatura? Talvez, neste caso, a indiferença se esteja a pagar com indiferença…

Teremos passado nós, em 250 anos, de uma iniciativa de esforços concertados para exterminar a “odiosa diferença” que separava o Algarve do restante território português, integrando-o nas políticas nacionais, para o actual alastramento pernicioso de uma odiosa indiferença, amplamente espelhada no desinteresse da classe dirigente pela região? Claro que não. Isto é, obviamente, o projecto pombalino, per se, não foi sinónimo de sucesso no contorno ao esquecimento da região por parte do centro de poder, como se daí em diante a região tivesse passado a ocupar um papel relevante no panorama nacional. Na verdade, este projecto de “Restauração” até serve para nos relembrar que esse esquecimento era crónico, que se manteve durante séculos, e que inclusivamente ainda se vai manter na época subsequente. Porém, este mesmo período da nossa História também pode servir para nos recordar que a indiferença perante as necessidades regionais não tem de ser o caminho a seguir e que nós, enquanto cidadãos bem formados, não a podemos, nem a devemos tolerar.



Andreia Fidalgo é “algarvia, natural de Castelo de Vide”. Sou filha de pai castelo-vidense e de mãe culatrense, e ter nascido na “Sintra do Alentejo” é um privilégio de que muito me orgulho – afinal de contas, trata-se indiscutivelmente da mais bonita vila do Alto Alentejano. O meu coração, porém, pertence ao “ardente Algarve impressionista e mole”, à Ria Formosa, e, especialmente, a Olhão, essa terra misteriosa de açoteias, de mareantes, de mirantes, onde vivo desde os cinco anos de idade – ainda que com alguns interregnos, é certo!
Nasci em 1986, ano em que o Cometa Halley veio visitar a Terra e, claro, anunciar o aparecimento de uma nova estrela: eu mesma! Abri os olhos pela primeira vez no início do Outono, pouco mais de nove meses depois de Portugal ter entrado para a CEE, pelo que só se pode daí inferir, obviamente, que estive a aguardar estrategicamente que o país reunisse condições económicas mais favoráveis para me receber condignamente. Não que isso me tivesse servido de muito… Concluí a licenciatura em Património Cultural, na UALG, em 2008, precisamente no annus horribilis da crise financeira mundial, o que não me facilitou nada a vida de recém-licenciada. Não esmoreci e nunca abandonei a Academia, num percurso sempre dedicado à investigação histórica e, actualmente, além de dar aulas de História Moderna na FCHS-UALG, sou doutoranda no ISCTE-IUL, no Programa Interuniversitário de Doutoramento em História. A tese, que espero finalizar dentro em breve, versa sobre as reformas económicas de inspiração Iluminista de que a região algarvia foi alvo nos finais do Antigo Regime. Congrega, pois, a minha preferência pelo estudo da Época Moderna e da História Económica com o meu tema de eleição: o Algarve.
Sou apartidária. Sou tendencialmente agnóstica. Os meus tempos livres ocupo-os com leituras, com a simplicidade de um passeio pelo campo ou à beira-mar (ou à beira-Ria), e com exercício físico, seja indoor ou outdoor. Adoro animais, especialmente gatos, seres infinitamente superiores a todos os outros. A minha cor preferida é o verde, a cor da Natureza, da Fertilidade e da Esperança.
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Abstenção, e então? (Oh, não! Mais um texto sobre eleições!)

11/10/2019

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Por Gonçalo Duarte Gomes

É verdade, mais um…

No entanto, e para lhe dar um twist interessante, aviso já que este traz a visão de uma espécie de Nuno Rogeiro do Mal, em que a abstenção não é crime, mas antes uma opção consciente, e com Game of Thrones à mistura…

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E se o Voto fosse Electrónico?

10/10/2019

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​Por Vanessa Nascimento
A abstenção continua a ser uma problemática que parece não ter resolução à vista. Os números desta realidade em Portugal são esmagadores mas a julgar pelos dados do Algarve e face à consulta meteorológica, resta-me concluir que metade do Algarve devia estar de férias no passado domingo dia 6 de Outubro!
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Até pode ser compreensível a desmotivação e a falta de identificação política nos dias que correm, a moral não é a melhor e as soluções não são imediatas. Porém, é preciso reflectir que a solução NÃO É, NEM DEVERÁ passar pela destituição da responsabilidade cívica que é o exercício e direito ao voto! E que a ausência de uma Democracia poderá mesmo conduzir a uma nova Ditadura. Em última instância penso que ninguém queira isso, mais que não seja porque depois deixamos de poder postar comentários nas redes sociais e falar mal dos políticos e do sistema, quando na verdade nem sequer fomos votar.

Então e o que teria acontecido no passado domingo se o Algarve tivesse conseguido votar a partir da praia?
​A Comissão Nacional de Eleições (CNE) tem vindo a reflectir sobre a questão do Voto Electrónico (presencial e não presencial), no fundo o aumento da eficiência, segurança e credibilidade no exercício do direito do sufrágio aliado à Inovação Tecnológica. Não estamos aqui a inventar a roda até porque já foram foram desenvolvidos em Portugal quatro experiências de voto electrónico, respectivamente em 1997, 2001, 2004 e 2005 (não vinculativas).

Gerimos os impostos pela Internet, marcamos consultas no SNS, utilizamos bancos online e porque não podemos  Votar? Claro que temos sempre de falar das vulnerabilidades de segurança e certamente iria ser necessário uma implementação complexa, mas desconheço a existência de um sistema infalível.  Estamos na Era do Digital, será que não estará na hora de pensarmos neste "Voto em Mobilidade? Resolver o problema não só do eleitor que quer ir para a praia mas de todos aqueles que estão longe de casa ou a trabalhar? 

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Cit in O Público 
Obviamente que os números não se devem única e exclusivamente ao fenómeno da mobilidade, há um aumento progressivo da proporção de portugueses que afirmam não se identificar nem se sentir próximo de qualquer partido político, logo menos propensos a participar nas eleições. Porém estou certa que muitos também não foram votar porque não saberem o que escolher! 
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Por Hugo van der Ding
Também aqui a tecnologia pode ajudar o eleitor! Tem vindo a ser desenvolvidos vários instrumentos online que através de grupos de perguntas o eleitor chega à resposta de qual o Partido que melhor representa as suas convicções, o EUandi é um exemplo disso. Novamente é preciso acautelar os processos de conceptualização e construção destas soluções, assim como, determinar muito bem a forma como este dados são utilizados e assegurar o anonimato e sigilo. 

É necessário desenvolver medidas concretas para baixarmos a Abstenção. Em 2018 levantou-se novamente a questão do Voto Remoto através da Internet e tem vindo a ser discutido o Voto Obrigatório, que levantou logo o alerta para uma base antidemocrática. Por outro lado fala-se também de medidas mais modestas como a melhoria do sistema do Voto Antecipado e uma Abordagem mais Educativa a nível Escolar. 

Seja qual for a resposta a esta problemática, acima de tudo o que importa é irmos VOTAR!
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Sobre as eleições legislativas no Algarve (I)

9/10/2019

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Por Bruno Inácio
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A análise do resultado de umas eleições, sejam elas quais forem, implica a meu ver um olhar apurado dos números e uma dimensão qualitativa da dimensão política dos mesmos.

Posto isto, quero partilhar convosco alguns numero que me parecem interessante e que nos escapam no quadro geral.
  • O PS ganhou a nível nacional  e foi considerado uma "grande vitória". No entanto teve menos 120 mil votos que a coligação Portugal a Frente (PSD + CDS) tiveram em 2015. Na altura a vitória da PaF foi considerada "pequena".
  • No Algarve, com apenas mais 1000 votos que em 2015 o PS elegeu mais um deputado (5, contra os 4 de 2015).
  • O PSD no Algarve teve uma quebra na ordem dos 12000 votos mas ainda assim consegue aumentar o número dos "seus" deputados tendo em conta que em 2015 um dos 3 eleitos era do CDS-PP. E relembre-se que José Carlos Barros é independente.
  • A CDU teve uma quebra de 4300 votos e perdeu o seu único deputado.
  • Em Faro, a vitória do PS é traduzida em menos votos que em 2015.
  • Os votos brancos e nulos têm "militantes" fiéis no Algarve. Em 2019 houve apenas menos 10 votos nulos e apenas mais 600 votos em branco.
  • Apesar do número de inscritos se ter mantido estável, apenas mais 6 mil em 2019, houve uma quebra de menos 18 mil votantes.
  • Houve 1036 pessoas que no Algarve entenderam votar no RIR, o partido de Tino de Rans.
  • Houve mais de 4000 votos na extrema-direita (CHEGA + PNR).
  • Em Lagos, onde a Presidente da Câmara foi candidata pelo PS em lugar elegível, o PS teve menos votos que em 2015. Em Tavira, onde o Presidente da Câmara foi candidato pelo PS em lugar elegível, o PS teve mais 76 votos.
  • Houve 15000 votos em partidos pequenos no Algarve. O PCTP MRPP teve mais votos que o Iniciativa Liberal.

Notas breves
  • Existe uma quebra de votantes no Algarve que deve preocupar a todos. Baixamos a fasquia dos 50% num quadro em que aumentaram o número de inscritos.
  • A importância de quem são os candidatos(as) é pouco relevante ainda que o circulo eleitoral não seja grande. Esta questão deve-se também a falta de espaço público na região. A não existência, por exemplo, de uma televisão regional, como existe no norte, não valoriza os nossos eleitos.
  • A bipolarização (ainda que o PSD tenha perdido eleitores) diminuiu drasticamente a pluralidade da representação partidária de algarvios na Assembleia da República. Tínhamos 5 partidos eleitos, passamos para 3.
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Costa: e agora?

8/10/2019

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Por Luís Coelho

Os dados disponíveis mostram que o Partido Socialista (PS) é o grande vencedor da noite eleitoral do passado dia 06 de Outubro (minto - na verdade, o que se observou foi uma nova derrota histórica da nossa democracia já que, sem surpresa, ficaram em casa mais de 4.2 milhões de Portugueses nestas eleições legislativas). De facto, o PS obteve mais 118 722 votos face a 2015, o que equivale a um crescimento homólogo de 6.8%. Já o Bloco de Esquerda (BE) e o Partido Comunista Português (PCP) perderam 58 405 e 116 863 votos (quebra homóloga de 10.6% e 26.2%), respectivamente. Conclui-se, pois, que a esquerda não ganhou. Quem ganhou foi o PS, algo que demonstra bem os efeitos assimétricos gerados pela dita “gerigonça”.

Mais à direita o cenário é  bem complicado. Em particular, em 2015, a coligação Portugal à Frente (que juntou o Partido Social Democrata - PSD e o Partido do Centro Democrático Social - CDS) arrecadou 1 993 921 votos (curiosamente, mais do que os 1 866 407 que o PS conseguiu agora). Em 2019 a soma dos votos nestes dois partidos não vai para além dos 1 637 001 votos. Verifica-se então um tombo de quase 20% em termos homólogos no número de votos expressos em urna nos partidos que representam a direita “tradicional” em Portugal.

As eleições trouxeram outras particularidades interessantes. Primeiro, a consolidação da base eleitoral do Partidos das Pessoas, dos Animais e da Natureza (PAN), que é para mim um dos grandes vencedores destas eleições. Muito atacado nas últimas semanas pela sua falta de ideologia política, o PAN tem vindo a centrar a sua mensagem num conjunto de temas que são relevantes para uma franja cada vez maior dos eleitores em Portugal: os jovens com formação académica superior. O resultado não deixa de ser poderoso: em 2019 o partido quadruplica o número de mandatos e vê a sua votação crescer 122% em termos homólogos face a 2015. Not bad para um partido “pós-ideológico”. Ao mesmo tempo, chegam à Assembleia da República novos partidos. Desde logo o Livre que, na minha opinião, vai disputar parte do espaço que até agora tem vindo a ser ocupado pelo BE. Veremos se tem capacidade para acrescentar algo ao debate político que seja relevante para a maioria dos Portugueses. Talvez sim, quando o assunto forem os temas sociais ditos fracturantes. Do lado oposto está o Chega. Contra tudo e todos, André Ventura lá conseguiu sentar-se na Assembleia da República e, goste-se ou não, promete agitar bastante as águas (o Prós e Contras de ontem parece ser um preview do que está para vir). Importa referir o Chega granjeou 66 442 votos  – dos ditos pequenos é o mais votado – número que é suficiente para colocar na agenda política temas tipicamente considerados tabu pela sociedade Portuguesa. Some-se a isto a personalidade peculiar do André e temos todos os ingredientes para uma sessão legislativa muito animada. Nota final para o Inicial Liberal (IL). Num tom mais cordato que o Chega, este partido promete agudizar a situação do PSD e, principalmente, do CDS. Tem um discurso vincadamente económico, com ideias concretas e propostas que são incómodas para quem está e esteve no governo (por exemplo, é interessante falar de impostos neste País sem qualquer filtro como o IL faz). Admito, no entanto, que o seu desafio é similar ao do Livre: afirmar-se na ala mais à direita ou perder-se sob o peso dos históricos. Veremos o que o futuro reserva.

Tudo isto serve apenas de pano fundo para a verdadeira reflexão que importa fazer. De facto, poder-se-ia pensar que António Costa tem tudo para estar feliz. Curiosamente, eu não partilho desta ideia. 2015 foi um ano muito mais interessante para Costa. O País estava a sair de um dos episódios mais tristes da sua história recente. Passos Coelho era o “inimigo público” de toda a esquerda com representação parlamentar e não tinha força para formar Governo. Vai daí, Costa aproveitou a oportunidade para mudar o rumo político do País. Nesse momento, estabelecer um acordo formal com o BE e o PCP não era fácil. Mas era possível. E Costa, político capaz e com provas dadas na arte da negociação, soube dar o suficiente e exigir o bastante para ter paz na Assembleia da República. À data somava-se ainda um detalhe importante: ninguém acreditava que a recém-formada gerigonça ia funcionar. Logo, se algo corresse menos bem, seria apenas normal.

Quatro anos volvidos tudo mudou. Por um lado, o PS queimou qualquer possibilidade de se entender de forma estável com os partidos da direita, que vão passar os próximos tempos a lamber as suas feridas e a tentar encontrar um rumo que lhes permita sobreviver. À esquerda o xadrez ficou mais difícil. Se há coisa que os números acima provam é que o BE não ganhou com a gerigonça e o PCP perdeu. Bastante. Logo, convencer estes partidos a coligar-se formalmente com o PS talvez seja possível mas a um custo que a maioria dos socialistas – acabados de ganhar eleições de forma retumbante – não vai aceitar de bom grado. Por outro lado, a opção PAN, a quem Costa piscou o olho de forma evidente durante a campanha preparando o plano B para a situação de não maioria absoluta, não chega. Intui-se pois um cenário de acordos pontuais aqui e ali de forma a ir governando o burgo, o que dará eventualmente azo a mais uns episódios de queijo limiano, com os resultados que são conhecidos.

A cereja no cimo do bolo é a expectativa das pessoas face a Costa (e seu governo). De facto, se em 2015 esta era genericamente baixa, Costa é hoje vítima do seu próprio sucesso. Dificilmente o mesmo Costa que resolveu nos últimos quatros anos, qual Bruno Fernandes nos (muitos) momentos de aperto do Sporting Clube de Portugal, pode agora vir dizer que a conjuntura politica interna não o deixa governar. Todos esperam (inclusivamente eu) que seja possível encontrar um quadro de estabilidade que permita navegar águas internacionais bem crispadas. Pensemos no Brexit, na guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, na tensão no médio oriente (e seus efeitos sobre o preço do petróleo) ou nos enormes desafios que se colocam à humanidade por conta das alterações climáticas.

É pois caso para dizer: Costa. E agora?
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Novo dia, novo parlamento, nova geringonça

7/10/2019

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Por Anabela Afonso

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A poucas horas de sabermos os resultados de mais umas eleições legislativas, ainda muita coisa está por definir naquilo que poderá ser a solução governativa para os próximos quatro anos, mas há alguns aspetos que, a esta curta distância de análise, parecem merecer referência:

Entre várias outras coisas que a chamada “Geringonça” nos trouxe nos últimos quatro anos, uma das mais importantes, a meu ver pelo menos, foi finalmente ajudar a clarificar o facto das eleições legislativas não terem como propósito direto eleger um governo, mas sim, a composição do parlamento. É certo que tradicionalmente o resultado das eleições determina a figura que o Presidente da República indigita para formar governo, mas a nomeação do primeiro-ministro e do governo é uma competência do PR e não um resultado imediato da escolha do voto direto dos eleitores. É pena que os partidos políticos não se esforcem mais para clarificar estas regras do jogo (que não são novas), e contribuam muitas vezes para deixar avolumar equívocos que em nada beneficiam o funcionamento da democracia.

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​A única “força política” que pode reclamar vitórias consecutivas de ato eleitoral para ato eleitoral, chama-se abstenção e continua a crescer consistentemente no território nacional, e em particular no Algarve, onde passou de 48,62% em 2015 para 54,17%. Arrisco dizer que, pela primeira vez desde que somos livres de ir a votos em Portugal, mais de metade da população do Algarve optou por não exercer esse direito/dever. Julgo, por isso, que, os partidos que conseguiram eleger deputados pelo Algarve, antes de festejarem os resultados, deveriam dar algum sinal de que esta não é uma preocupação apenas dos dias que antecedem eleições, integrado nos discursos que todos os partidos fazem de mobilização do seu eleitorado (que não é mais do parte do esforço para ganharem votos para as suas forças políticas), mas que é um aspeto central do funcionamento do nosso sistema democrático que importa encarar de frente, logo no dia seguinte, pensando soluções em conjunto (e não em competição entre si), que possam ser testadas até se encontrar a fórmula que fará as pessoas regressarem à participação. Talvez uma das primeiras coisas a mudar seja perceber-se, de uma vez por todas, que se torna muito evidente que a maior parte dos partidos só se preocupam com a participação dos cidadãos na política quando chega a altura de lhes pedirem o voto, e isso é algo que contribui de forma determinante para a crescente desconfiança no sistema e nos seus atores.

Segundo os dados publicados no site da Administração Interna, no caso do Algarve, PS, PSD, BE e CDU perdem, em conjunto, 135.000 votos em relação a 2015. Eu sei que para os partidos o que conta é os votos que cada um teve, e se algum de entre os enumerados cresceu é o que interessa. Mas se nos abstrairmos de uma análise clubística dos resultados, o que estes números mostram é que no Algarve houve uma redução muito significativa dos votos nos partidos tradicionais do sistema. E isso deveria ser o suficiente para uma reflexão conjunta do fenómeno da abstenção, já que muito provavelmente ilustra a perceção crescente que os deputados eleitos pelo Algarve, não representam os interesses da população que os elege, mas sim, em primeira instância, os interesses partidários, que, infelizmente, em muitos casos, não coincidem com os da região.

Por fim, e para terminar com uma nota positiva, hoje acordámos com uma perspetiva de um parlamento mais diverso, mais plural, que representa diversas visões de como nos devemos organizar enquanto sociedade e mais equilibrado em termos do que somos enquanto país. Sabendo que isto pode trazer mais tensão aos próximos quatro anos de vida parlamentar, estou em crer que será um retrato mais fiel daquilo que é a vida de cada um de nós. Resta-nos esperar que isso também se reflita na solução governativa para os próximos quatro anos.

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à beira do voto

4/10/2019

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Por Sara Fernandes

​Como devem saber foi constituída uma Comissão eventual de Acompanhamento do Processo de Definição da “Estratégia Portugal 2030” (CEPT2030) com voto unânime do Parlamento, e é a primeira comissão eventual dedicada à estratégia nacional no âmbito de um quadro comunitário, e pelo que consta isto é território virgem! Esta comissão é pioneira a nível de parlamentos nacionais da União Europeia.

O objectivo principal desta comissão foi receber contributos em audições descentralizadas em que participaram mais de 138 pessoas e entidades de diversos sectores de actividade local, regional, nacional e internacional.
​
A nossa audição regional teve lugar na Universidade do Algarve no dia 18 de Dezembro de 2019 e reuniu as seguintes entidades: Universidade do Algarve, AMAL – Comunidade Intermunicipal do Algarve, Região de Turismo do Algarve, CCDR - Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, Câmara Municipal de Faro, Rota Vicentina e a QRER – Cooperativa para o desenvolvimento dos territórios de baixa densidade.

Após todo este levantamento de contribuições “ambiciosas, informadas e decisivas” nasceu um relatório final que viu aprovadas 95 conclusões.
Como tudo isto “faria correr muita tinta” e estamos em época de poupanças, vou já directa ao assunto que considero que merece destaque a nível regional e nacional: o interior! Quanto a este tema há uma conclusão em destaque que gostaria de utilizar como base para apreciar o programa eleitoral dos diversos partidos sobre esta matéria:
 
“Promover o combate à interioridade e às assimetrias territoriais, através do investimento nos serviços públicos que ajude à fixação de pessoas em territórios de baixa densidade populacional e que permita prover bens e serviços públicos, habitação, correios e telecomunicações”.
 
Analisemos em 5 partes as medidas que constam nos programas eleitorais dos partidos que se encontram em campanha:
 
1. Combate à interioridade e às assimetrias territoriais
Aliança - Maximizar o aproveitamento de fundos comunitários, contribuindo para a recuperação do património histórico e consolidação de iniciativas e focos culturais, contribuindo em simultâneo para atenuar as diferenças regionais valorizando o interior;
Aliança - Incorporar a coesão territorial, como preocupação transversal, em todas as áreas da governação, impondo que políticas sectoriais contribuam para o povoamento;
Aliança - Criar políticas incentivadoras do investimento no interior, seja através da afetação privilegiada dos fundos comunitários a projetos dinamizadores e sustentáveis, seja através da captação de investimento externo;
Aliança - Propor no plano de investimento e das obras públicas as que se entendam mais prementes para o desenvolvimento do Interior, como seja a requalificação das infraestruturas aeroportuárias, da ferrovia entre outras;
BE - Elaborar uma estratégia de valorização do território e das comunidades rurais assente na transformação agrícola e florestal;
CDS - Negociar com Bruxelas a implementação de uma Zona Económica Especial que disponha de um quadro regulatório especial para o interior do país.
CDU - Promover políticas de defesa e valorização do mundo rural e das regiões do interior e insulares, em particular com políticas de investimento adequadas;
PDR - Desenvolver as zonas do interior do país que têm sido votadas ao abandono.
 
2. Incentivos à fixação 
Aliança - Reforçar benefícios fiscais para empresas e famílias que se fixem nas regiões do interior;
CDS - Propor que o valor das taxas a cobrar na tabela de IRS sejam inferiores às taxas normais. Seria desejável que estas taxas pudessem progressiva e faseadamente ser reduzidas para quem resida ou venha a residir no interior;
CDS - Propor uma taxa de 10% no IRC para todas as empresas que desenvolvam, e venham a desenvolver, a sua actividade no interior e que criem emprego;
CDS - Propor que o Regime Contratual para o Investimento ou o Benefício Fiscal Contratual ao Investimento Produtivo passe a ter limiares de admissão mais baixos (metade) quando se trate de investimentos do interior;
CDS - Aumentar as deduções à colecta para educação e habitação em IRS para os contribuintes no interior;
Livre - Discriminar positivamente o interior, através da redução de IRS para todos os trabalhadores e a redução no IRC para as empresas que criem empregos no interior;
PAN - Desenvolver ofertas formativas que possam contribuir para a fixação da população em territórios do interior;
PDR - Majorar incentivos fiscais e financeiros a investimentos nas regiões do interior;
PS - Apostar no potencial competitivo dos territórios de baixa densidade, para acolher investimento empresarial inovador e competitivo;
PS - Lançar um programa de mobilização da diáspora, incentivando os nossos emigrantes a investir no interior;
PSD - Rever os escalões de atribuição do abono de família, alargando a base de beneficiários, majoração do montante da prestação no segundo filho e seguintes em 50% e para as famílias que vivem no interior;
PSD - Aumentar as deduções com as despesas de Educação em sede de IRS, prevendo--se a majoração da medida nos territórios do interior;
PSD - Desenvolver, de uma forma integrada, o interior do nosso país, criando circuitos e atividades turísticas mais diversificadas;
PSD - Renovar incentivos às regiões do interior, nomeadamente através da criação de incentivos financeiros e fiscais ao estabelecimento de clusters / zonas económicas;
 
3. Serviços Públicos
Aliança – Promover em articulação com o poder local a descentralização e deslocalização de serviços do Estado para o Interior;
Aliança - Defender a autossustentabilidade das localidades do Interior, garantindo às populações, a prestação dos serviços públicos essenciais, seja na saúde, na educação, na segurança e na proteção civil;
BE - Dinamizar programa de reabertura gradual de serviços públicos nos territórios de baixa densidade;
BE - Dar autonomia e responsabilização aos serviços públicos na execução dos seus orçamentos, nomeadamente despesas correntes e quadros de pessoal;
BE - Reverter a fusão de freguesias nos casos em que a população o deseje, com base em processos referendários;
CDS - Aumentar até 15% a participação variável dos municípios do interior do IRS para devolução integral aos munícipes e aumentar o prazo de isenção de IMI de três para sete anos para habitação própria e permanente;
CDS – Defender a fusão voluntária dos municípios;
PS - Eliminar ou simplificar processos burocráticos que atualmente constituem um entrave à fixação da atividade económica, reduzindo os custos de contexto;
PSD - Implementar um Programa de Desconcentração que deslocalize progressivamente alguns serviços públicos relevantes para fora das maiores áreas metropolitanas.
 
4. Habitação
PAN - Alargar a oferta de habitação pública, a preços acessíveis (renda condicionada), em territórios do interior do país onde existe maior despovoamento;
PS - Facilitar a mobilidade habitacional e territorial, mediante a implementação do programa Chave na Mão;
PS - Implementar o programa Reabilitar para Povoar, com o objetivo de alargar a oferta de habitação nos territórios do interior a preços acessíveis.
 
5. Transportes e vias de comunicação
Aliança - Isentar de portagens as ex-Scuts (A4, A22, A23, A24 e A25) para residentes e empresas fixadas no interior;
CDS - Propor que os custos de transporte, desde a gasolina ou gasóleo, os bilhetes de comboios e de camioneta ou as portagens, possam ser deduzidos à coleta por parte dos contribuintes que habitem no interior;
PS - Incentivar a mobilidade coletiva nos territórios do interior, através de planos de mobilidade.
 
Após este resumo, cabe a cada um de nós tirar as suas conclusões tendo em atenção 3 questões: estas medidas são realmente exequíveis? Os partidos que as promovem estão realmente preocupados com esta temática ou consideraram “o interior” um assunto-chave para a diferenciação eleitoral? Será que após a analisar as medidas referentes ao interior e de outras temáticas nos respectivos programas eleitorais “o todo é maior que a soma das partes”?

As respostas a estas questões irão certamente conduzi-los a um voto consciente para as eleições legislativas que se realizam já no próximo domingo, 6 de Outubro. O seu voto poderá ser útil ou de protesto, o que realmente importa é que vote! Este é o momento de cada um exercer o seu direito de escolha. E quem não escolhe, não tem outra alternativa se não comer o que lhe “servem no prato”.

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