Por Gonçalo Duarte Gomes A área da Brandoa, ali para os lados da Amadora, nos arrabaldes e às portas da capital Lisboa, foi durante muito tempo considerada a maior área urbana de génese ilegal da Europa, que é como quem diz, o maior bairro clandestino do continente. Agora que entramos no último fim-de-semana de um Agosto de loucura algarvia que nem uma pandemia conseguiu travar, e que não corremos o risco de melindrar Nosso Senhor Turismo – vade retro – talvez fosse boa oportunidade para se falar de um certo “abrandoamento” que, de ano para ano, cresce na Ria Formosa... Não, não falo das ocupações ilegais em Domínio Público Marítimo nas ilhas-barreira. Isso é coisa que já tem indulto, bênção e bónus do regime, e a factura já está passada para gerações futuras, pelo que é deixar andar, e ver como se cose (ou coze!) a coisa com as alterações climáticas – comme d’habitude, de resto! Mas gosto da vossa forma de pensar. Falo, isso sim, da proliferação e dispersão desenfreada e descontrolada de embarcações ao longo do plano de água e margens da Ria Formosa. Barcos, barquinhos, barcões e, pasme-se, até casas flutuantes, praticamente tudo o que bóie serve para este caótico condomínio aquático, pouco menos do que ao sabor da vontade. Em época estival então, formam-se autênticos bairros flutuantes, como a foto acima tenta ilustrar, no caso ao largo da Ilha da Culatra. A Ria Formosa é um espaço idílico, que exerce sobre qualquer pessoa um sortilégio irresistível. Junta a isso condições ímpares para a prática da náutica de recreio e para os desportos náuticos, algo que é incontestável, ainda que, numa opinião pessoal, mais nas vertentes “suaves” (ver aqui). Mais, tal vocação deveria ser plena e efectivamente assumida por todas as urbes ribeirinhas, localizadas no arco “continental” do sistema lagunar – insisto no facto do desporto escolar aí não passar, pelo menos nos meses mais quentes, por uma aposta consolidada, sistemática e abrangente na náutica, ser mistério incessante. No entanto, tal deve sempre ser ponderado no quadro da sensibilidade dos valores e recursos naturais presentes numa área que é, também, Parque Natural da Ria Formosa. Esta classificação é o reconhecimento último da presença de um modelo equilibrado entre as actividades humanas (produtivas mas também recreativas) e os valores ambientais que lhes servem de base.
Sendo equilíbrio a palavra chave. A quantidade, densidade e desorganização que actualmente se verifica dificilmente trará benefícios a alguém. Desde o arrasar dos fundos – cujas pradarias são importantes habitats para espécies emblemáticas – pelo fundear das embarcações à ocupação desregrada de praias não regulamentadas (transformadas em sanitários a céu aberto, como no caso do pequeno bote em primeiro plano na foto, de onde desembarcaram quatro mânfios, orgulhosos do que iam fazer, cada um com o seu rolo de papel higiénico), passando pela erosão de margens e sapais causada pela ondulação do rasto das embarcações, pelos perigos para a navegação ou por águas residuais e/ou cinzentas deitadas borda fora em escape livre, os danos e riscos são variados. Os benefícios, é certo, também existem. Descer e subir embarcações, e abastecê-las, dá dinheiro. O vai e vem constante das carreiras de passageiros de e para as ilhas, e das marítimo-turísticas a descarregar lotes de turistas nos areais também, tal como os voos rasantes dos táxis marítimos – ultrapassados em velocidade apenas por essas pérolas dos mares que são as motas de água. Dos Alojamentos Locais flutuantes, nem falar! E todas estas actividades geram importantes empregos, dinamizando muitas outras actividades relacionadas. Portanto, ainda bem que existem tais actividades, e que as pessoas contactam, usufruem e se deixam encantar por este património comum. Mas que não seja um amor de perdição. Embora brutalmente resiliente, qual o ponto de ruptura do sistema da Ria Formosa, face à sua capacidade de carga? E no entretanto? E depois? Será a receita fiscal dessas actividades investida na preservação e recuperação dos ecossistemas? Abdicarão os promotores de lucros para esse efeito? Haverá recuperação possível? E serão esses mealheiros suficientes? Para que este não se torne mais um caso de proxenetismo paisagístico no Algarve, mais vale prevenir, apostando atempadamente na organização e gestão do plano de água e suas interfaces terrestres, de forma coerente e equilibrada, para que todas as actividades possam coexistir, respeitosamente ajustadas à capacidade da Ria Formosa. Para tal, há desde logo um longo caminho de capacitação das entidades administrativas e fiscalizadoras (Capitanias, Polícia Marítima e Vigilantes da Natureza à cabeça) pela frente. Com meios, recursos e... respaldo político para que possam cumprir a sua missão, num diálogo franco mas firme com todos os actores envolvidos. Seria criminoso ver a Ria Formosa transformada na sucursal de Sotavento do chavascal verificado na costa a Barlavento, em que as grutas e algares, para além de uma barulheira muitas vezes ensurdecedora, se enchem de embarcações e dos mamíferos que dentro delas se atafulham, em densas nuvens de fumo, o que lhes permite saírem quais enchidos de fumeiro, direitinhos para as bem regadas e mal musicadas grelhadas mistas, em areais transformados em arraiais. Agora parece que até uma rave flutuante se vai juntar a este circo ali para os lados de Lagos... Sem fruição ou vivência. Apenas afluência. A Ria Formosa vale tudo. Mas na Ria Formosa não pode valer tudo.
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Por Gonçalo Duarte Gomes Muhammad Saeed al-Sahhaf era o Ministro da Informação, e porta-voz do governo de Saddam Hussein, durante a invasão do Iraque, em 2003. Porventura o mais fervoroso e pioneiro adepto do #vaificartudobem, al-Sahhaf ficou conhecido pelo seu optimismo néscio e pela capacidade de não deixar que a realidade e os factos afectassem o seu discurso. Particularmente famosa foi a sua alegação de não se verificar a presença de quaisquer forças invasoras na cidade de Bagdad quando, a poucas centenas de metros do local onde proferia a sua conferência de imprensa, as colunas de tanques da coligação ocidental se avolumavam. Ora bem, já que o problema da falta de água no Algarve não é estruturalmente tratado, precisamos de alguém que, com esse abnegado mas cândido espírito de militante alucinação e simultânea alegria, nos convença que tem avonde d’água nesta região, suficiente para cobrir todos os desvarios, e que, faltando, teremos sempre mojitos, caipicoisas e beberagens que tais, como nos mostram os bonitos e influenciadores rabos e abdominais do Estangrã em silly season! Notícias recentes dão conta das reservas hídricas do Algarve não durarem para lá do final do ano, na sequência do relatório do Grupo de Trabalho de assessoria técnica à Comissão Permanente de Prevenção, Monitorização e Acompanhamento dos Efeitos da Seca, datado de 30 de Junho (disponível aqui). Concretamente, e espreitando a actualização de Julho do Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos, as reservas de superfície (independentemente do fim a que se destinam) algarvias estavam nisto:
Isto, é sabido, preocupa pouca gente – zero selfies com fish gapes e peace signs com uma barragem vazia em fundo, e em tão pouca água, um Presidente da República Mitch Bacano não salva ninguém… – e ainda menos entre a maior parte da gente que tem um papel mais preponderante, que é quem decide. Vai daí, e embora desde há muito se fale de medidas de racionamento dos consumos na origem, tarda em ver-se algo acontecer.
E o que é facto é que o Algarve se ocupa a sonhar não com utilizar melhor e mais conscientemente a água que tem, mas antes com dotar-se de infra-estruturas que lhe permitam continuar a desperdiçar água à bruta, seja por perdas ou projectos megalómanos - que se fazem não só de novas barragens (ver aqui) mas também do somatório de pequenos projectos, como aqui se abordava há coisa de um mês, relativamente a piscinas - seja a promover o aumento de culturas produtivas de regadio em regime intensivo – as quais, arrisco dizer (agradecendo genuinamente correcção em caso de erro), não servem sequer uma reserva estratégica de segurança alimentar da região, que não come o que produz, nem produz o que come… Agora que o Reino Unido deu carta branca às viagens sem constrangimentos “covídicos” entre aquele país e Portugal, animam-se as hostes pela perspectiva de alguma mitigação de tesouraria adicional deste annus horribilis daquele que era o milagre económico mais sólido na história da Humanidade: o turismo algarvio. O reverso da medalha desse encher dos bolsos, é, no entanto, o vazar adicional do odre regional em que se acumula a água, reduzindo a folga que advinha da redução dos consumos por menor número de visitantes estivais e, em consequência, da minimização do factor de ponta – razão entre os consumos máximos de determinado período e a média anual – num sector que representa 21% do total dos consumos regionais. O impacto que isso pode vir a ter, num quadro de incerteza extrema quanto à generosidade do clima? Como diria al-Sahhaf: “As nossas barragens transbordam. Os nossos aquíferos fazem repuxo. Tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis.”. Por Andreia Fidalgo Em pesquisas recentes na Biblioteca Nacional Digital, deparei-me com um interessante exemplar cartográfico, intitulado Mappa Geografico do Reyno do Algarve, de autoria do Eng.º Baltazar de Azevedo Coutinho, e datado de 1791. Já passei os olhos neste mapa, noutras ocasiões, mas a verdade é que nunca o tinha analisado com a merecida atenção. É, a todos os níveis, uma peça cartográfica notável, quer pelo nível de informação que contém, quer pela sua beleza artística. Na senda do seu mestre Eng.º José Sande de Vasconcelos, Azevedo Coutinho deixou-nos um mapa que além de cumprir a sua função primordial de reconhecimento da região sob o ponto de vista da defesa militar, deixa também registada informação relevante sobre a organização e divisão administrativa do território e até sobre os recursos económicos aí existentes. Ora vejamos. No que respeita à organização administrativa do território – à qual já aludi anteriormente aqui no Lugar ao Sul –, o mapa é posterior às reformas pombalinas da década de 70 de Setecentos. Por alvará de 16 de Janeiro de 1773, o concelho de Alvor foi extinto e passou a integrar o concelho de Vila Nova de Portimão; o vasto e empobrecido concelho de Silves foi subdividido, dando origem a dois novos concelhos, o de Monchique e o de Lagoa; o lugar de Moncarapacho, dividido entre o termo de Tavira e o termo de Faro, passou a ficar inteiramente sob a jurisdição de Faro. Mais tarde, no Algarve oriental, seria fundada Vila Real de Santo António, oficialmente inaugurada a 13 de Maio de 1776, em cujo termo ficaria incorporado o entretanto extinto concelho de Cacela.
O mapa também reflecte a divisão do território por comarcas, que após a reforma administrativa pombalina se configuravam da seguinte forma: a comarca de Tavira, que incorporava os concelhos de Tavira, Loulé, Castro Marim e Vila Real de Santo António; a comarca Lagos, que contava os concelhos de Lagos, Albufeira, Portimão, Vila do Bispo e Aljezur; e a comarca de Faro, pertença da Casa da Rainha, constituída pelos concelhos de Faro, Silves e Lagoa. Quanto ao termo de Alcoutim, configurava uma excepção na realidade regional, pois à data encontrava-se incorporado na comarca de Beja. Posteriormente, a organização concelhia do Algarve viria ainda a sofrer duas grandes alterações dignas de referência, que lhe conferiram a configuração que actualmente lhe reconhecemos. Por alvará régio de 15 de Novembro de 1808, o lugar de Olhão foi elevado a vila de Olhão de Restauração, e por alvará de 20 de Abril de 1826 oficializou-se a criação do concelho de Olhão, determinando-se que o seu território deveria englobar as freguesias de Moncarapacho, Quelfes e Pechão, até então pertencentes ao concelho de Faro. Por outro lado, já durante a Primeira República, em 1914, o concelho de Faro ainda veria o seu território ficar mais diminuído com a criação do concelho de São Brás de Alportel, que subtraiu ao concelho a freguesia com essa designação. A criação dos concelhos de Olhão e de São Brás de Alportel diminuiu substancialmente o território do concelho de Faro, que já de si era bem menor do que outros concelhos algarvios, como Tavira, Loulé ou Lagos. Talvez seja caso para indagar se estes “golpes” não terão contribuído também, aliados a outros factores, para a incapacidade de Faro se afirmar, mesmo na actualidade, no desempenho do seu papel enquanto capital de distrito. No que respeita aos recursos económicos da região, este mapa regista as principais produções, por concelho e respectiva comarca. Relembra o figo, a amêndoa e a alfarroba com uma produção generalizada a quase todos os concelhos algarvios, oscilando entre a mais intensa ou mais moderada; relembra a excepcionalidade de Monchique, capaz de produzir “toda a qualidade de frutas”, a que acrescem a madeira de castanho, as castanhas e o mel; relembra que a produção de vinho era bastante comum em concelhos como Faro, Albufeira, Lagoa, Portimão, Lagos e Silves; relembra, igualmente, a vocação de algumas localidades na produção de peixe seco e salgado, nomeadamente Vila Real de Santo António, criada especificamente para esse efeito. Outro pormenor interessante é o facto de este mapa registar, ao longo do desenho da costa, a localização das armações de atum. São sete, as que aparecem registadas: Beliche, Almádena, Torralta, Torraltinha, Faro, Fuzeta e Tavira. Algumas décadas antes, o terramoto de 1 de Novembro de 1755 havia contribuído para a destruição substancial das almadravas algarvias, posteriormente revitalizadas com as reformas pombalinas, através da criação, por alvará de 16 de Janeiro de 1773, da Companhia Geral das Reais Pescarias do Reino do Algarve. Esta foi a última das companhias monopolistas pombalinas a ser instituída, e garantia o controlo e intervenção do Estado sobre o atum e a corvina, reservando às restantes espécies o comércio livre. O mapa apresenta outros mais detalhes por explorar, nomeadamente a nível da toponímia, da orografia e até dos eixos viários terrestres que ligavam (com muita dificuldade), o Reino do Algarve a Lisboa. Deixo aqui o meu convite, ao leitor, para explorar e analisar este belo exemplar cartográfico, que configura um testemunho de muito valor para a compreensão da história regional. Por Gonçalo Duarte Gomes Minha aldeia, voltei! Avé-Marias… Evocou-se em mim este poema de Bernardo Passos, intitulado “Regresso”, a propósito da notícia, fresquinha, de que quatro aldeias algarvias – Alte, Cachopo, Paderne e Parises, respectivamente dos concelhos de Loulé, Tavira, Albufeira e São Brás de Alportel – se vão preparar para integrar uma candidatura ao selo “Aldeias de Portugal”, uma rede nacional “de aldeias autênticas e genuínas”. Não beliscando a bondade de qualquer iniciativa que pretenda dinamizar áreas de interior –mais ainda estando a sua dinamização por cá nas mãos da Associação In Loco, que tem provas dadas – há aspectos nestes programas que merecem alguma cautela. É destacado o enfoque que o título “Aldeias de Portugal” tem no potencial turístico de aldeias “autênticas e genuínas”, tendo por objectivo “preservar, valorizar e dar a conhecer a essência da vida nas aldeias”, através da consolidação dos “valores culturais” em que assenta a sua identidade e do incentivo à “partilha do estilo de vida dessas aldeias e dos seus habitantes, oferecendo aos visitantes uma experiência única de convivialidade e contacto com um Portugal autêntico”.
As quatro aldeias seleccionadas possuem claríssimas diferenças entre si, quer estruturais, quer funcionais. No entanto, partilham entre si – com excepção de Paderne – um padrão de desumanização e abandono. Olhando para os dados dos censos populacionais à escala da freguesia, entre 1981 e 2011, Cachopo e Alte perderam, respectivamente, 63% e 51% da sua população. Em sentido contrário, em igual período Paderne aumentou a população em 13%. No caso da aldeia de Parises – a mais bonita de todas elas, digo desde já com confesso enviesamento – é mais difícil obter dados, já que o concelho de São Brás de Alportel possui uma única freguesia. No entanto, se considerarmos que nos dois terços da área desse concelho que são cobertos pela serra, correspondendo a cerca de 10.122 hectares, dificilmente se encontra 5% da população do mesmo, ou seja, nem 530 pessoas, dá para ter uma ideia do que por lá se possa estar a passar. Se a isto juntarmos o padrão de regressão nas actividades tradicionais destas zonas rurais, nomeadamente na agricultura, pastorícia e silvicultura “tradicional” (termo arriscado, eu sei), falamos exactamente de quê, quando nos propomos preservar, consolidar, vivenciar e partilhar estilos de vida? O próprio conceito das aldeias se proporem trabalhar para ser genuínas e autênticas é potencialmente problemático, pois faz imediatamente soar o alerta da folclorização, seja ela ao nível da arquitectura, dos hábitos, dos trajes, dos dizeres, entre muitas outras coisas. É que genuinidade e autenticidade construídas para uma candidatura… são artifícios. E parques temáticos já temos muitos. Acresce que nestas coisas do turismo como fio condutor, é sabido – no Algarve de forma traumática – que a obsessão pela criação de “produtos” é meio caminho andado para esvaziar a essência das zonas bafejadas por tal milagre, deixando bonecos ocos que, em tempos como o presente, nem para miolo de enxergão servem e que o tempo apaga sem marca positiva deixada, de resto como outros programas no passado. Dir-se-á, até pelo cenário demográfico já invocado, que pouco há para estragar, nesse capítulo. E poderá até bem ser verdade, mas só se pede particular cuidado com isso. Outra questão prende-se com o pensar as aldeias sem pensar as paisagens em que se inserem. Estando nós num contexto de vocação mediterrânica, a aldeia não existe sem a paisagem envolvente – de onde retira o sustento – da mesma forma que a paisagem depende em muitos aspectos das dinâmicas da aldeia, seja para organização e manutenção de estruturas ancestrais, seja para animação de vários processos. Há portanto uma dimensão telúrica e de profundidade paisagística que não pode ser esquecida. Num programa como este, que pretende “estimular o surgimento de oportunidades locais de negócio através da valorização, promoção e comercialização de produtos locais, eventos tradicionais e serviços turísticos baseados nas experiências vividas”, como se processará este regresso ao campo, à aldeia, com turismo (lazer) a puxar por produção (labor)? Para onde se escoarão os produtos? Que camponeses híbridos daqui resultarão? i-agricultores, farm-villagers, de enxadas touch-screen? Poderemos ainda ser aquela “gente do campo”, simples e sem grande inquietação aparente, ao ritmo das estações, que “dorme e sorri [como] um passarinho, sob a asa da mãe agasalhado”? É que a sociedade da informação, nas suas diversas expressões, desassossegou-nos o espírito, e as alterações climáticas baralharam-nos as Primaveras e Outonos. Ou os novos rurais “apenas” entregam chaves, mudam camas e informam sobre passwords de wifi? Como (re)ruralizar? As paisagens resultantes da interacção da cultura contemporânea com um ecossistema em desequilíbrio e readaptação servirão este propósito? Já agora, esta coisa do próprio conceito de “interioridade”, que no Algarve surge de forma cada vez mais vincada e inaceitável, por força das crescentes assimetrias regionais, comandadas pela maior ou menor proximidade do buliçoso litoral, tem muito que se lhe diga. Nesta nossa fímbria de terra, isto equivale a dizer que numa ridícula distância que oscila entre os 30 a 50 km na direcção latitudinal, a região se cliva por completo, passando da massificação para o despovoamento. Se pensarmos esta distância na unidade pela qual contemporaneamente a medimos, e que é o tempo, no intervalo de no máximo uma hora – mais coisa menos coisa – de caminho, o Algarve eclipsa-se. A par de rejuvenescidas aldeias, e em seu auxílio, talvez a ideia de uma verdadeira coesão territorial no Algarve não fosse mal pensada… Bernardo de Passos era um poeta romântico, em que saudade e passado são temas constantes. E o romantismo é muito importante, na medida em que aporta a componente sentimental que é fundamental que esteja presente em tudo o que seja humano. Mas não pode estar só. O delicado desafio que se coloca perante estas quatro aldeias, a equipa que vai gerir e acompanhar o processo e todas as comunidades e agentes envolvidos será o de descobrir as melhores respostas possíveis para estas, e muitas outras questões que seguramente surgirão, com o necessário compromisso entre esse romantismo bucólico e o necessário pragmatismo, fugindo ao pastiche e a uma interpretação urbana do rural. Que o consigam, aqui se deixando votos de sucesso! |
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