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De acordo com os Censos, o Algarve é um balão

30/7/2021

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Por Gonçalo Duarte Gomes

Foram recentemente divulgados os resultados provisórios dos Censos 2021 (aqui), e ficou a saber-se que, a nível nacional, entre 2011 e 2021, das duas únicas regiões (NUTS II) a registar aumento populacional, o Algarve foi líder, com 3,7% de crescimento
(ainda que continue a ser a menos povoada do território continental), deixando a Área Metropolitana de Lisboa, com os seus míseros 1,7%, a milhas!
 
A notícia parece estar a gerar algum entusiasmo, ou pelo menos a causar algum impacto, neste nosso canto. Verdade seja dita, posta assim a coisa, pouco ou nada diz. Estando a silly season mesmo aí à porta, também não interessa grandemente.
 
Mas devia, porque de pouco adianta ter mais gente, se isso servir apenas para diluir a qualidade e acessibilidade aos serviços de interesse geral (ver a potencial importância do tema aqui), já de si profundamente desequilibrada.
 
De qualquer modo, vamos a números.
 
Dos 16 municípios algarvios, 11 aumentaram a sua população, enquanto que 5 perderam. O campeão dos ganhos foi o município de Vila do Bispo (8,8%), com Albufeira (8,2%) e Lagos (7,9%) a completar o pódio. Na ponta oposta da tabela, Alcoutim (-13,6%) liderou as perdas, seguido de Monchique (-9,6%) e Castro Marim (-4,6%). Pelo meio, uma surpreendente – ainda que não muito significativa – perda populacional em Olhão (1,7%). No “top 10” dos crescimentos concelhios a nível nacional, o Algarve conta com 4 representantes: Vila do Bispo (5.º), Albufeira (7.º), Lagos (8.º) e Portimão (9.º, com 7,7%).
 
Desenhado sobre um mapa, o panorama é o seguinte:
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Variação populacional nos Municípios algarvios 2011-2021 (Azul - perda / Salmão - ganho. Fonte: INE)
​Se a distribuição populacional pelos concelhos já revela uma tendência preocupante de perdas populacionais no “interior” (conceito muito relativo no Algarve, em que a distância máxima ao litoral se mede em meia centena de quilómetros) e nas periferias, e um consequente acentuar das assimetrias regionais, interessará ainda mais olhar para o cenário ao nível das freguesias.
 
Aí verificamos que há um esvaziar global do interior algarvio, com as freguesias interiores a apresentarem perdas significativas, conforme ilustrado no mapa seguinte:
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Variação populacional nas freguesias algarvias 2011-2021 (Fonte: INE)
​Recorrendo novamente aos “tops” para tentar ter uma ideia do enquadramento da realidade algarvia no contexto nacional, a região conta com 4 das 10 freguesias de maior crescimento: União de Freguesias de Conceição e Cabanas de Tavira (Concelho de Tavira, em 4.º lugar, com 36,2%), Barão de S. Miguel (Concelho de Vila do Bispo, em 7.º, com 30,6%), Armação de Pêra (Concelho de Silves, em 9.º, com 23,3%) e Luz (Concelho de Lagos, em 10.º, com 22,9%).
 
Em sentido inverso, conta com a 4.ª freguesia que mais perdeu população em Portugal: Giões, Concelho de Alcoutim, com 40,6% de perda populacional. Fora do “top”, mas com números muitíssimo preocupantes, temos também as freguesias de Cachopo (Concelho de Tavira, em 14.º, com perdas de 34,2%) e de Vaqueiros (Concelho de Alcoutim, em 20.º, com perdas de 33,0%).
 
A tabela completa das freguesias algarvias apresenta-se de seguida (incluindo também os municípios, identificados com códigos de 4 algarismos):
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Fonte: INE
​O cenário populacional algarvio, naquilo que foi a sua evolução na última década, é então o de um balão: aumentou o volume, inchou, mas no meio é vazio, tendo apenas ar.
 
O aprofundar das assimetrias da distribuição populacional regional, com o aumento da concentração litoral, vem apenas confirmar uma das doenças demográficas crónicas do Algarve, que é a desumanização das paisagens interiores, maioritariamente associadas a tecidos rurais, social e economicamente deprimidos.
 
Ora, minha gente, sem gente não há gestão de paisagens. E aí, deixamos estas áreas entregues a dinâmicas que podem não ser, do ponto de vista da competitividade, da coesão territorial ou da gestão do risco, as mais agradáveis. Por exemplo, se calhar é mais fácil combater fogos com escolas e centros de saúde em Giões, Odeleite ou Alferce, do que com aviões e bombeiros a arriscar a vida. E mais barato, e mais saudável.
 
Há muito que se fala nisto – houve inclusivamente umas Comissões Técnicas Independentes que até escreveram uns relatórios – mas pouco se tem feito. Ou conseguido fazer, sejamos justos.
 
De caminho, fica também demonstrado que ideias como coesão territorial (perdoem-me a repetição do chavão), reforço da atractividade do interior, e outras coqueluches de oratória, não conseguem passar do papel, e os modelos que realmente se implementam na paisagem, inclinam a região em direcção ao mar. E, mesmo dentro desse modelo, importa perceber que fortes apostas na terciarização (principalmente associadas ao turismo e ao imobiliário para fins turísticos), mesmo em freguesias urbanas, resultam em perdas populacionais (por exemplo, a freguesia de Olhão, com uma perda de 4,7%) e esvaziamento vital – mesmo que o dinheiro circule, não há gente a viver – das próprias urbes.
 
Estas tendências – importa dizê-lo – são muitíssimo mais amplas que o Algarve. A nível nacional, cerca de 50% da população nacional concentra-se em 31 municípios, sendo que a fatia de leão se localiza maioritariamente nas duas principais áreas metropolitanas (Lisboa e Porto).
 
Esta análise, muito simples, carece naturalmente de complemento e ponderação com outros factores e indicadores. Mas, para já, é inequívoco o progressivo e inexorável esvaziar populacional do interior algarvio.
 
É agora necessário saber se queremos fazer algo quanto a isso, se o conseguimos fazer, quando estamos a pensar fazê-lo, e se vamos novamente esperar resultados diferentes da aplicação das mesmíssimas receitas do passado.
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Escapismo urbanístico

16/7/2021

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Por Gonçalo Duarte Gomes

Olhando a mais recente intervenção de “arte urbana” na Vivenda Vitória, em Olhão, é impossível não experimentar sentimentos mistos, oscilando entre a admiração e o lamento.

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​Este edifício integra a História contemporânea da cidade, e por ela passam memórias da indústria conserveira, que marca o Século XX olhanense – mais alguma informação disponível aqui. Mergulhado num processo de degradação que a posse pública não estancou ou reverteu (não foi sequer alvo de classificação como imóvel de interesse municipal), o seu estado de conservação agudiza-se continuamente. Eis então o lamento.

Como forma de mitigar visualmente (apenas) esta situação, têm sido promovidas algumas acções de arte urbana nas fachadas. A mais recente, em linha com anteriores, denota traços de enorme talento por parte dos seus autores – os quais, desconhecendo, saúdo, revelando a admiração.
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​As aspas que anteriormente enquadraram o conceito de arte urbana para identificar estas pinturas prende-se com a ideia, meramente pessoal e nada especializada, de que essa forma de expressão artística tem uma forte componente de activismo (social, ambiental, económico, etc.), destinada a provocar, no espaço público, debates geradores de novos discursos e gestos culturais, urbanos mas não só. Ou seja, tem uma forte componente de análise crítica, muito para lá da mera estética – ao ponto de se poder questionar se uma obra de Banksy, expoente máximo desta circunstância artística, exposta em galeria, respeita ainda o espírito da sua criação.

Arte urbana não é assim um prenúncio de morte sussurrado aos edifícios ou espaços intervencionados, como parece acontecer, por exemplo, em Portimão, onde há um mês foi noticiada a intenção de aquisição de imóveis devolutos (desconheço a sua relevância arquitectónica, ou falta dela) que há já longo tempo haviam sido objecto de intervenções artísticas, tendo como fim a sua demolição para abertura de uma nova rua entre o Largo do Dique e o Largo 1º de Dezembro. A arte urbana é antes a tentativa da sua inserção num contexto, ou criação desse mesmo contexto, razão pela qual também não pode nunca ser confundida com o mero vandalismo, ou deixar que esse tente parasitar aquela. Mesmo quando intervém sobre edifícios degradados ou outras situações dissonantes, e mesmo que o contexto pareça discutível, o que, desejavelmente, será sempre.

Quando, há mais de uma década, o Programa Crono – de que Alexandre Farto [Vhils] era um dos curadores – ocupou, por exemplo, as fachadas de edifícios devolutos na Av. Fontes Pereira de Melo, em Lisboa, com obras de grandes nomes internacionais da street art (em inglês tem sempre mais élan), como Blu, “Os Gémeos” ou ARM Collective, marcou aquele que é, porventura, o primeiro grande momento de “turistificação” deste fenómeno na capital. Sabemos, por amarga experiência própria, que o turismo como fim em si próprio, tende a esterilizar o substrato em que germina (tanto mais que, 11 anos volvidos, os edifícios continuam devolutos e as obras... foram conspurcadas com tags, graffitis e o tal mero vandalismo!). Mas, sendo a questão lançada a um debate que é público e aberto, tem o seu espaço.
​
Outro exemplo positivo, a intervenção do artista Styler (João Cavalheiro) na Av. Estados Unidos da América, no final do ano passado e também em Lisboa, criando um mural de homenagem ao Arq.º Paisagista Gonçalo Ribeiro Telles, por ocasião da sua morte.
​Igualmente, em Faro foram recentemente instaladas obras de Bordalo II (Artur Bordalo), no campus de Gambelas da Universidade do Algarve e também na Praia de Faro, com o cavalo-marinho e ameaças que sobre a espécie impendem na Ria Formosa, como mote.

Estes escassíssimos exemplos demonstram como a arte urbana tem um – forte – papel a desempenhar nos diálogos que o espaço público promove, devendo ser encarada como manifestação de toda uma circunstância social que procura os seus canais e linguagem, de forma a contribuir para a construção do seu tempo.

Por isso mesmo, e independentemente do seu valor intrínseco, não deve nunca servir como escapismo urbanístico.

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Razão pela qual importaria que o magnífico trabalho gráfico que hoje decora as paredes da Vivenda Vitória, e outros casos similares, um pouco por toda a parte, não fosse apenas uma mortalha, enquanto se aguarda pelo colapso...
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Kit de Sobrevivência à Vacinação

5/7/2021

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Por Vanessa Nascimento
Um tsunami de elogios têm sido feitos ao Almirante Gouveia e Melo pelo seu exímio desempenho na vacinação contra o Covid-19. Mal sabia eu que a vacinação propriamente dita, podia também ser toda ela uma “experiência de cariz militar” (quase).
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A missão estava agendada para 16h32 do 05/07/2021, cheguei era 16h10... Para perceber o decorrer das operações e em escassos minutos a única coisa que me inteirei foi que tínhamos sido lançados na selva e no meio do caos. A fila dos agendamentos parecia uma píton gigante entrelaçada em volta do pavilhão de vacinação, quando achávamos que o fim da fila estava à vista, a cobra serpenteava e continuava. Um verdadeiro filme de terror até para quem não tem medo das ditas cujas. 

Não consigo deixar de pensar que pelo menos os militares quando vão em missão vão preparados, nós os que esperamos mais de 4h para ser vacinados, levamos apenas a nossa moral... Sem sombra, água, comida e casa de banho durante 4h percorremos o serpentear da fila. Eu diria que o Chuck Norris, o "Rambo" ou o Bruce Willis ficariam orgulhosos dos 700 resistentes que estavam agendados para o dia 05/07/2021, até porque o tempo que esperamos para sermos vacinados dava para ver pelo menos dois filmes destes senhores.
​

"Agendamento" fui ver o que isso significava no dicionário, não fosse eu ter apanhado demasiado sol na cabeça e ficado baralhada das ideias... Até porque ouvi a frase... "O agendamento é meramente indicativo e por ordem de chegada". Não sei hesito...
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Fiquei confusa! Se a coisa é meramente indicativa mais vale dizer o dia e depois vamos quando quisermos…Não? E irmos preparados para tudo... dita a minha experiência que um   “Kit de Vacinação” é recomendável:
  • Chapéu de sol
  • Protector solar
  • Água 
  • A “bucha” a.k.a. comida
  • Opcional mas recomendado uma cadeira
  • Música e/ou um livro, sudoku, palavras cruzadas… é ao gosto do futuro vacinado 

O mais dantesco é que a Task Force veio a público dizer: 

“Já era expectável que isto acontecesse esta semana, face ao número de vacinas que vamos dar, mas é indesejável que as pessoas estejam tanto tempo na fila e vamos tentar melhor o processo”, disse à Lusa o vice-almirante Gouveia e Melo, que coordena a ‘task-force’ responsável pelo processo de vacinação contra a covid-19.”

​E porque criticar sem dar solução é na minha perspectiva lançar palavras ao vento fica aqui os meus 2 cêntimos de recomendações em caso de espera prolongada: 
  • Arranjar staff para orientar as pessoas, organizar as filas e dar informações;
  • Fornecer água a quem está na fila à mais de 45 minutos, o lanchinho que me ofereceram à saída da vacinação às 20h47 da noite tinha sido uma mais valia durante a espera;
  • Identifiquem pessoas prioritárias ao longo da fila (grávidas, idosos, pessoas com handicaps temporários) e tenham cadeiras para dispensar em casos que se justifique;
  • Providenciem zonas de sombra estamos em pleno verão no Algarve;
  • E por último mas não necessariamente em último, peguem no tempo médio de atendimento de uma pessoa agendada, equacionem o staff disponível e calculem o número médio de não agendados que é possível atender. Pessoalmente matemática é o meu calcanhar de Aquiles, mas até um leigo consegue identificar que é necessário haver um “tecto” no número de atendimentos. Deixo a imagem da hora que sai do centro de vacinação, recordando que cheguei às 16h10.
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​
​Faço ainda a ressalva que isto não significa que a vacinação seja assim todos os dias… e vai na volta apanhei um dia excepcionalmente mau, a minha descrição depreciativa depreende-se sobretudo com a falta de adaptação no momento e com a incapacidade de dar condições a quem teve que passar por esta experiência. 

Quero terminar a agradecer ao casal que me ofereceu uma garrafa de água ao final de 3h30 ao sol e todo o staff do centro de vacinação que fez horas extraordinárias no meio do caos para dar resposta a esta situação.

Sintoma global do pós-vacinação falta de paciência extrema... Quanto aos restantes possíveis efeitos secundários terei alguma dificuldade em perceber se foram da vacina ou do tempo e condições de espera para a mesma!
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O fungágá da bicharada

2/7/2021

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Por Gonçalo Duarte Gomes

O Parque Natural da Ria Formosa (PNRF) tem andado nas bocas do Algarve, em tempos recentes, pela aparente impotência face a diversos atropelos que ocorrem nesta área protegida, em plena luz do dia e de forma reiterada e perfeitamente descarada.

Já (aqui) houve oportunidade de tentar analisar as causas para as limitações e desautorizações que afectam o PNRF e o seu organismo tutelar, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P. (ICNF). Entre elas, e talvez à cabeça, encontra-se o desfasamento entre a magnitude das suas atribuições e os meios – humanos, materiais e financeiros – afectos à tarefa.

A ajudar à festa, a publicação do Decreto-Lei n.º 46/2021, de 11 de Junho, veio também, entre outras alterações, acometer ao ICNF competências no domínio... dos animais de companhia!

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Assim, a um Instituto humana e materialmente já assoberbado no desempenho das suas normais competências, decidiu-se assim atribuir um novo conjunto de incumbências, com implicações ciclópicas e que, na prática, se antecipam inexequíveis.

​E que fundamentalmente introduzem, a martelo, nos afazeres do ICNF matérias que nada têm a ver com o seu âmbito e que, sob vários aspectos, são antagónicas à sua essência.

Entre estas encontram-se a definição e aplicação das políticas de bem-estar, detenção, criação, comércio e controlo das populações de animais de companhia, a definição de estratégias adequadas à protecção desses mesmos animais de companhia em situações de acidentes graves e catástrofes, ou ainda assegurar o cumprimento das regras aplicáveis à detenção, criação, comércio e exposição de animais de companhia.

Coisa pouca, portanto.

Na génese do que hoje é o ICNF está o Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico, fundado em 1975, no âmbito da organização da Secretaria de Estado do Ambiente. Destinava-se a inventariar, estudar e gerir paisagens e sítios e respectivos elementos caracterizantes, definindo áreas de protecção e a promulgação de medidas que protegessem os respectivos valores presentes (naturais e culturais), entre as quais a constituição de Áreas Protegidas e a elaboração e dinamização dos seus planos de ordenamento. Tudo isto numa óptica de valorização paisagística, cultural, cívica e física, sempre orientada para as populações e inserida numa lógica de coesão territorial.

Desse organismo de visão abrangente, de organização política, territorial e de perenidade, hoje pouco resta. Por circunstâncias várias (que aqui não cabem), a sua missão está sectorialmente mais restringida, centrando-se em matérias de conservação estrita, nomeadamente em termos de áreas protegidas e classificadas.

Com a presente alteração, ainda menos sobrará.

Para além das óbvias questões ontológicas encerradas no confronto entre perspectivas urbanas e rurais que a atribuição destas competências traduz, há questões imediatas, práticas, que saltam à vista.

Hoje em dia, o fenómeno dos animais de companhia assilvestrados (seja por fuga, por abandono ou por desorientação) representa uma ameaça séria para a conservação de várias espécies da fauna selvagem que se tornam alvo de comportamentos predatórios, bem como factor de desequilíbrio para as dinâmicas de certos habitats e populações.

Quando confrontado com o dilema entre ter que salvaguardar espécies selvagens e conter populações ou comunidades de animais de companhia assilvestrados, o que fará o ICNF?

Mais, atentando na redacção do novel Artigo 2.º-A do Decreto-Lei n.º 46/2021, lemos que, bem-estar animal é entendido como “estado de equilíbrio físico e mental de um animal em relação às condições em que vive e morre, incluindo a ausência de fome, sede e má nutrição, de desconforto físico e térmico, de dor, lesão e doença, de medo e stresse, bem como a oportunidade de expressar o seu comportamento natural”.

A conceptualização num tema destes não é fácil, muito menos consensual mas, à luz desta visão, não terá então o ICNF a obrigação de, por exemplo, libertar todos os animais enclausurados em apartamentos exíguos ou outras condições inadequadas e até insalubres, onde passam boa parte dos seus dias fechados, sozinhos, impedidos de “expressar o seu comportamento natural”? E se, ao “expressar o seu comportamento natural”, estes animais colocarem em risco outras espécies, concretamente espécies protegidas, como se sana este conflito, desde logo interno, do ICNF?

Torna-se claro que este acrescento orgânico é uma resposta à pressão política que cresce em torno dos animais de companhia. Esta traduz, no seu cerne, uma evolução positiva relativamente à forma como a sociedade encara os animais e à ética que devemos emprestar ao seu tratamento. No entanto, se esta visão se desconectar de um quadro mais amplo e, principalmente, se descontextualizar de princípios ecológicos (como, por exemplo, as relações de predação ou a dominância de espécies), e a sua concretização passar pelo prejuízo de uma política integrada de conservação da natureza, seja por conflito de competências ou desvio/reafectação de recursos manifestamente escassos, representará apenas um retrocesso.

As instituições da Administração representam e servem o Estado, não o Governo.

Assim, se há um interesse, por exemplo partidário, no quadro de alianças parlamentares, em ceder a agendas animalistas – que, regra geral, acrescentam zero – e outras visões sectoriais e sectárias nesse domínio, seguramente que o ICNF não é a sede própria ou veículo adequado para tal.

Até porque, a médio e longo-prazo, tanto a inviabilidade do modelo como a sua contradição intrínseca não só não representarão qualquer mais-valia para os animais de companhia e para a resolução das faltas de que são vítimas, como gerarão um efeito diametralmente oposto.

Entre bichanos e bicheza há diferenças fundamentais, que também institucionalmente devem ser preservadas.

Caso contrário, tudo se tornará um fungagá da bicharada.
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