Por Gonçalo Duarte Gomes Na sequência do alerta lançado recentemente por Miguel Freitas, Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, relativamente ao risco de incêndios severos e intensos que incide sobre o Algarve, o Primeiro-Ministro não demorou a tomar medidas. Vai daí, hoje mesmo encontra-se no Algarve. Para dar abraços. A árvores. Abraços verdes. Com criancinhas. E depois ir ver carros de bombeiros e helicópteros e muitas outras maravilhas, neste alegre nervoso miudinho que antecede a foliona época de fogos! Esperemos apenas que, nestas andanças, não tenha que ir pela EN125, ou que o almoço não lhe caia mal e tenha que recorrer aos equipamentos de saúde algarvios… Já agora, esperemos também que, nestas teatralizações, ao contrário de outras idas desta peça ao palco, tire as mãos dos bolsos.
Não apenas literal como também figurativamente, porque, embora sendo Dia da Criança, se calhar já chega de nos tratarem como tal. É que em matéria de fogos, continuamos à espera da dramática mudança que os mais de 100 cadáveres deixados a fumegar em 2017 impõem. Não este show-off de milhões para o combate, de contratos dúbios, de ligações manhosas, de cargos pomposos, de leis perfeitamente absurdas, de vaidades passeadas em encenações fantasiosas. Sem inverter – ou pelo menos estancar – o processo de desumanização das nossas paisagens, recuperando, reinventando, actualizando modelos anteriores, de equilíbrio entre o ordenamento e gestão do combustível, num processo vivo e orgânico associado ao trabalhar da terra, e o fogo, componente intrínseca das dinâmicas ecológicas, não vamos mudar nada. E, quanto a isso, nada se faz ou quer fazer. O esvaziamento do interior e a sua desvitalização, expressa no desaparecimento das actividades que tradicionalmente caracterizavam a sua paisagem e a sua vivência continuam. Ao ponto de azarar qualquer pessoa que ouse sequer tentar o contrário. Basta ver o próprio ministro Pedro Siza Vieira, que parecia estar a delinear pensamento e estratégia bastante interessantes acerca deste tema, agora embrulhado numa trafulhi… lapso. Cada serrenho que morre, cada sobreiro que sucumbe – e neste momento caiem que nem tordos –, cada pessoa que esquece a serra, cada rebanho que não pasta, cada metro quadrado de mato que cresce descontrolado, cada terreno cujos marcos desaparecem ou é esquecido, ou perdido em litígios eternos entre herdeiros, é um passo para a repetição dos grandes incêndios. Por isso mesmo, façam as festas que quiserem, mas vamos lá ver se qualquer dia não é o afectuoso Marcelo quem está por aí a distribuir abraços chamuscados…
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