Por Gonçalo Duarte Gomes Muhammad Saeed al-Sahhaf era o Ministro da Informação, e porta-voz do governo de Saddam Hussein, durante a invasão do Iraque, em 2003. Porventura o mais fervoroso e pioneiro adepto do #vaificartudobem, al-Sahhaf ficou conhecido pelo seu optimismo néscio e pela capacidade de não deixar que a realidade e os factos afectassem o seu discurso. Particularmente famosa foi a sua alegação de não se verificar a presença de quaisquer forças invasoras na cidade de Bagdad quando, a poucas centenas de metros do local onde proferia a sua conferência de imprensa, as colunas de tanques da coligação ocidental se avolumavam. Ora bem, já que o problema da falta de água no Algarve não é estruturalmente tratado, precisamos de alguém que, com esse abnegado mas cândido espírito de militante alucinação e simultânea alegria, nos convença que tem avonde d’água nesta região, suficiente para cobrir todos os desvarios, e que, faltando, teremos sempre mojitos, caipicoisas e beberagens que tais, como nos mostram os bonitos e influenciadores rabos e abdominais do Estangrã em silly season! Notícias recentes dão conta das reservas hídricas do Algarve não durarem para lá do final do ano, na sequência do relatório do Grupo de Trabalho de assessoria técnica à Comissão Permanente de Prevenção, Monitorização e Acompanhamento dos Efeitos da Seca, datado de 30 de Junho (disponível aqui). Concretamente, e espreitando a actualização de Julho do Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos, as reservas de superfície (independentemente do fim a que se destinam) algarvias estavam nisto:
Isto, é sabido, preocupa pouca gente – zero selfies com fish gapes e peace signs com uma barragem vazia em fundo, e em tão pouca água, um Presidente da República Mitch Bacano não salva ninguém… – e ainda menos entre a maior parte da gente que tem um papel mais preponderante, que é quem decide. Vai daí, e embora desde há muito se fale de medidas de racionamento dos consumos na origem, tarda em ver-se algo acontecer.
E o que é facto é que o Algarve se ocupa a sonhar não com utilizar melhor e mais conscientemente a água que tem, mas antes com dotar-se de infra-estruturas que lhe permitam continuar a desperdiçar água à bruta, seja por perdas ou projectos megalómanos - que se fazem não só de novas barragens (ver aqui) mas também do somatório de pequenos projectos, como aqui se abordava há coisa de um mês, relativamente a piscinas - seja a promover o aumento de culturas produtivas de regadio em regime intensivo – as quais, arrisco dizer (agradecendo genuinamente correcção em caso de erro), não servem sequer uma reserva estratégica de segurança alimentar da região, que não come o que produz, nem produz o que come… Agora que o Reino Unido deu carta branca às viagens sem constrangimentos “covídicos” entre aquele país e Portugal, animam-se as hostes pela perspectiva de alguma mitigação de tesouraria adicional deste annus horribilis daquele que era o milagre económico mais sólido na história da Humanidade: o turismo algarvio. O reverso da medalha desse encher dos bolsos, é, no entanto, o vazar adicional do odre regional em que se acumula a água, reduzindo a folga que advinha da redução dos consumos por menor número de visitantes estivais e, em consequência, da minimização do factor de ponta – razão entre os consumos máximos de determinado período e a média anual – num sector que representa 21% do total dos consumos regionais. O impacto que isso pode vir a ter, num quadro de incerteza extrema quanto à generosidade do clima? Como diria al-Sahhaf: “As nossas barragens transbordam. Os nossos aquíferos fazem repuxo. Tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis.”.
1 Comment
Jose
28/8/2020 05:03:14
EM VEZ DE OBTER UM EMPRÉSTIMO, OBTENHA UM CARTÃO ATM EM BRANCO E SEJA RICO EM MENOS DE 7 DIAS!
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