Por Gonçalo Duarte Gomes Uma das muitas coisas que provavelmente choca o Mundo em relação a Donald Trump é o facto de, pela primeira vez em muitos anos, vermos um político cumprir escrupulosamente com o que prometeu em campanha, mesmo tratando-se, na maior parte dos casos, de boçalidades que oscilam entre a insanidade e a mera infantilidade. Os próprios americanos foram apanhados de surpresa, e insurgem-se violentamente contra um resultado que deixaram na mão do acaso, como o demonstrou uma abstenção de cerca de 42%... Ao menos nós por cá somos mais sossegadinhos, apesar de também gostarmos que nos enganem. Para nós, à mulher de César não basta parecer badalhoca. Tem que ser mesmo! O jornal Observador publicou recentemente uma notícia dando conta do resultado da aplicação do Código de Conduta aprovado pelo actual Governo (e idêntico a outros documentos já vigentes, com o mesmo objectivo), na sequência do regabofe que foram as viagens à bola, pagas pela Galp a membros do Executivo e deputados.
Pasmem-se as almas, pois foi parida mais uma lusa vaca voadora, e Portugal tem o primeiro Governo na história da Humanidade sem quaisquer conflitos de interesse! Obviamente que isto é uma grande patranha, destinada a atirar areia para os olhos do povão, algo que, de resto, as próprias declarações constantes na notícia comprovam. Torna-se tanto mais ridícula esta encenação por se tratar de conflitos de interesses, situações perfeitamente naturais (todas as pessoas abrangidas têm certamente percursos de vida que geraram contactos, ligações, afinidades) que, desde que atempadamente declaradas e resolvidas, evitam o clima de suspeição de corrupção que é apanágio da nossa constelação partidária. Ignorar o elefante na sala apenas dá razão a quem aponta a piedosa eutanásia como o único caminho para o nosso sistema político, e abre caminho ao tão falado populismo que grassa pelo Mundo. No entanto, nós aparentamos gostar da coisa assim como está, pouco dada à transparência, e é por isso que não exigimos alternativas, e papamos, entre muitas outras cenas, a do deputado que, enquanto cidadão, recomenda a si próprio, enquanto deputado, tomadas de posição contrárias às que assumiu… É esta vertigem pelos números circenses que, bem lá no fundo, origina um certo arrepio de admiração ao ver a desfaçatez com que o Governo mentiu na cara de todos os algarvios, aquando do número de malabarismo do cancelamento dos contratos de prospecção e exploração de hidrocarbonetos do caseirinho Sousa Cintra, enquanto, por outro lado, autorizava a Eni e... a Galp a escarafunchar ao largo da costa de Aljezur. Soubesse o nosso intrépido e patusco empreendedor de Vila do Bispo o que sabe hoje, e talvez tivesse também levado a malta à bola. Foi forreta, tramou-se. Assim como nos tramamos nós, sem possibilidade de confiança neste pessoal. O anterior Ministro do Ambiente, Moreira da Silva, achava os algarvios uns tolinhos, instrumentalizados nesta contestação à exploração de hidrocarbonetos por meia dúzia de “camones”, cujo objectivo é manter a nossa santa parvónia very typical para se gabarem lá nas terrinhas que vivem ainda num Terceiro Mundo bucólico. Agora, pelos vistos, somos vistos como o célebre elefante do Jardim Zoológico de Lisboa, que em troca de um amendoim (o arrumar da Portfuel), vai, todo contente, tocar a sineta. O facto de entretanto nos darem à mesma cabo da savana, mas a começar por outra ponta… são peaners, como diria um p(r)o(f)eta do futebol. Num outro escrito, já tive oportunidade de esclarecer que reconheço toda a legitimidade a este Executivo, e à maioria parlamentar que o suporta, nesta partilha com o anterior governo da visão de um Portugal gloriosamente petrolífero e/ou gaseificado. Pluralidade não é sermos muitos a dizer a mesma coisa, mas antes muitas coisas diferentes a serem ditas. Do debate e confronto das ideias resultará depois um ou outro desfecho. Ainda assim surpreende, mas importante é que se assumam, deixando cair os rodeios e as hipocrisias, para que saibamos com o que contar e para que conheçamos todos os que temos que enfrentar nesta discussão. Para já, fica a preocupação pela facilidade com que nos vão mentindo, talvez por sermos poucos, talvez por não termos peso político específico, talvez por sermos apenas o recreio do resto do País. Mas é bom que aprendam a respeitar-nos o suficiente para pelo menos nos enganar com categoria. Assim, estamos mal.
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