Por Patrícia de Jesus Palma A Universidade do Algarve e todos os que a sonharam, a defenderam, nela trabalharam e trabalham diariamente em prol da excelência e do desenvolvimento estão de parabéns! A UALG tem sido uma das forças motrizes da transformação da sociedade algarvia nas últimas décadas, mas o seu contributo para a sociedade do conhecimento extravasa e amplia largamente as fronteiras da região, como é desejável, e o seu símbolo, gizado pelo genial Tóssan, tão bem ilustra. Símbolo original da Universidade do Algarve, da autoria de Tóssan. Foto gentilmente cedida por Salomé Horta, a quem agradeço. ![]() Nesta data, é o porvir da instituição o que mais preocupa e, de forma geral, o do ensino superior, como se pode acompanhar pela Convenção do Ensino Superior, que hoje tem início no ISCTE para estabelecer uma «agenda para a década, que dê ao ensino superior uma ideia delineada de futuro». Ainda assim, não queremos deixar de assinalar que as mudanças ocorrem na espessura do tempo e que esse tempo nem é tão curto nem tão vácuo, como tantas vezes supomos. Neste meu primeiro texto de Janeiro, mês presidido pelo deus Jano – o que contempla vigilante o passado e o futuro –, pareceu-me oportuno trazer à colação não apenas os 40 anos da UALG, mas os 228 anos de ensino superior no Algarve, na esperança de que possamos compreender, de forma mais justa, o lugar do Algarve na história da produção e difusão do Saber. Em 1787 foi criada, na cidade de Tavira, a Aula de Artelharia, Geometria, Fortificação e Desenho, com a autorização do governador e capitão-general do Algarve, 6.º conde de Val de Reis e direcção do Eng.º José de Sande Vasconcelos. A Aula foi oficializada por Estatutos próprios em 13 de Setembro de 1796, considerando-se então como «Curso de Estudos Militares» e incluiu no curriculum as ciências matemáticas, fortificação de campanha, castrametação, defesa de praças, análise inferior ou álgebra e desenho, ministradas pelo referido Eng.º Sande de Vasconcelos e pelo capitão Baltazar de Azevedo Coutinho. O documento estatutário brilha como o mais completo e complexo que se conhece deste período e como testemunho do processo de escolarização nacional sob iniciativa militar, mormente na área da matemática, prevendo-se a possibilidade de frequentar ainda mecânica, secções cónicas e artilharia, esfera, geografia, trigonometria esférica e astronomia. Na época, apenas a recente Faculdade de Matemática da Universidade de Coimbra (1772), a Academia Real da Marinha (1779) e a Academia Real de Fortificação e Desenho (1790) ofereciam formação superior em matemática. O plano de estudos, desenhado e posto em prática por Sande Vasconcelos para o «Curso de Estudos Militares», estava em plena consonância com o das Academias Reais. Não estranhemos. O Curso, e demais aulas regimentais similares, foi reconhecido pelo Alvará de 13 de Agosto de 1790 como equivalente ao ministrado pela Academia Real da Marinha, alcançando assim o estatuto de Ensino Superior. Com métodos, modos e bibliografia actualizados, o Curso funcionou continuamente entre 1787 e 1808 e consolidou-se como pólo de formação científica em matemática aplicada à prática militar, mas com influência muito para além do círculo restrito do exército. No final da vida, José de Sande Vasconcelos pôde afirmar: «tendo ensinado com tanto desvelo, que os seos discipulos são os melhores desenhadores de Portugal, tendo desempenhado a obrigação dos seos postos em Rosilhom, sahindo da sua Aula officiaes benemeritos p.ª todos os Corpos do Exercito, e athé p.ª Capitaes Generaes.» Que a Universidade do Algarve possa continuar a corresponder aos anseios dos que a procuram, não descurando o legado da região (para quando a reabertura do mestrado em História do Algarve?) e a sua própria história, e que possa continuar a formar os melhores de Portugal e do mundo são os meus votos sinceros!
Viva a UALG!
6 Comments
Miguel
7/1/2019 21:03:13
Bem haja a Ualg, que não obstante padece dos problemas de tantas outras, na forma de falta de financiamento e da procura de colmatar essa falha com uma visão por vezes demasiado mercantilista do ensino superior. Para quando também a licenciatura em Direito, ou em ciências sociais ligadas ao Estado, Ambiente ou Gestão territorial? O curso de sociologia da ualg mais parece um de Economia Social, e onde estão os mestrados, pós graduações nestas areas similiares que não sejam sobre turismo ou novas migrações? O Algarve (ainda) não é uma região autónoma, mas é preciso criar um corpo de estudantes e investigadores que olhem para estas problemáticas, produzam conhecimento cá sobre os temas em questão e assim contribuam juntamente com a nata da Ualg na investigação marinha, turistica, saúde etc para o desenvolvimento integrado da região.
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Patrícia de Jesus Palma
8/1/2019 08:59:53
Precisamente, Miguel. E em muitas áreas, continua a ser necessário sair do Algarve para poder estudá-lo. Obrigada pela sua leitura e comentário.
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Paulo Martinho
7/1/2019 22:45:43
Ui, foi mesmo antes das elites chegarem à conclusão da absoluta impossibilidade de, numa cidade algarvia de então como numa de hoje, ser impossível a florescência de uma ideia peregrina. Por mim não só não me queixo como me regozijo com o facto de uma vida intelectual ser, no Algarve, (que seca e que ridículo provincianismo), uma absoluta falta de gosto : "Considerai como crescem os lírios do campo, eles não trabalham nem fiam, contudo vos digo que nem Salomão em toda a sua glória se vestiu como um deles." Aviso que demolirei quem tente demover-me com vários poemas do gabarito de Álvaro de Campos que confirmam o que digo. Menos claro o F.G e o Z.B. mas prontos, eles gostam tanto de viver esse sonho que a malta releva além de que fica bem ter alguém que combata moinhos ou o mundo não seria mundo.
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Patrícia de Jesus Palma
8/1/2019 09:08:02
Caro Paulo, o problema é que para florescer é preciso cultivar e para isso têm sido poucos os dispostos e parcos os meios. Ainda bem que há quem continue a combater moinhos!
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Luís Filipe Oliveira
9/1/2019 14:44:31
Cara Patrícia,
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Patrícia de Jesus Palma
10/1/2019 14:43:35
Caro Luís, muito obrigada pela leitura e pelo esclarecimento quanto à possibilidade de seguir a opção, agora incluída em História e Patrimónios.
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